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O abuso do princípio da insignificância

Redação Direito Diário

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Atualizado pela última vez em

 por Ingrid Carvalho

O Direito Penal no ordenamento jurídico pátrio tem aplicabilidade mínima, isto é, nem tudo que impactar a sociedade será resolvido por tal ramo. Não há necessidade de criminalizar certa conduta se ela pode ser sanada perfeitamente por outras áreas do direito, como por exemplo, pela área cível.

É o denominado ultima ratio, expressão em latim que significa “em última razão” ou “em último recurso”.

Em tese, as normas penais seriam aplicadas em casos de grande relevância social, como por exemplo: homicídio, roubo e furto. Casos menos graves seriam tratados por outros ramos ou, dependendo da relevância, seriam esquecidos.

Os princípios são pressupostos que permanecem no plano abstrato. São, portanto, subjetivos na sua aplicabilidade, variando seu uso e sua intensidade de acordo com o caso concreto.

Em decorrência disso, o STF inseriu pressupostos objetivos para determinar quando o princípio da insignificância será aplicado. Vejamos o que foi constatado pelo Ministro Luís Roberto Barroso (BRASIL. STF, 2014, online, grifo nosso):

Na sessão de hoje proferiu voto o relator, ministro Luís Roberto Barroso. Ele argumentou que a ausência de critérios claros quanto ao principio da insignificância gera o risco de casuísmos, e agrava as condições gerais do sistema prisional. O ministro lembrou que a jurisprudência atual do STF para a aplicação do princípio leva em consideração os seguintes critérios: o reconhecimento de mínima ofensividade, a inexistência de periculosidade social, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Contudo, é possível deparar-se com entendimentos que distorcem e abusam do genial princípio em questão, a fim de praticar e absolver práticas criminosas ardilosas.

É comum encontrarmos situações de pessoas manifestando pensamentos ofensivos sobre temas polêmicos e alegarem o princípio da insignificância para se esquivarem de suas responsabilidades. Também é comum a alegação defensiva nas práticas de furtos e outros crimes.

Com a ocorrência do abuso desse paradigma, podemos enxergar o aumento do seu reflexo nos pressupostos estabelecidos pelo STF.

Lembrando que o princípio da insignificância busca evitar que a injustiça aconteça à luz da Constituição. É uma forma de controlar e filtrar fatos que não sobrecarreguem a esfera penal, que não ofendam a economia processual e, claro, que não sejam desproporcionais e irrazoáveis.

É o que o Ministro Teori Zavascki observou sobre os recentes julgados de três Habeas Corpus 123108, 123533 e 123734 (BRASIL. STF, 2014a, 2014b , 2014c, online):

Segundo ele, embora se possa afirmar que a vítima pode recorrer à Justiça para buscar a reparação civil, exatamente pelo baixo valor dos objetos furtados e das condições dos autores, essa possibilidade seria meramente formal. Salientou que, adotar o princípio da insignificância indiscriminadamente em casos de pequenos furtos, com qualificação ou reincidência, seria tornar a conduta penalmente lícita e também imune a qualquer espécie de repressão estatal. 

“É preciso que o Tribunal tenha presente as consequências jurídicas e sociais que decorrem de um juízo de atipicidade em casos como estes. Negar a tipicidade destas condutas seria afirmar que, do ponto de vista penal, seriam lícitas”, ressaltou.

No entendimento do ministro, é inegável que a conduta – cometimento de pequenos furtos – não é socialmente aceita e que, ante a inação do Estado, a sociedade pode começar a se proteger e buscar fazer “justiça com as próprias mãos”. Argumentou, ainda, que a pretexto de proteger o agente, a imunização da conduta acabará deixando-o exposto a situação de justiça privada, com consequências imprevisíveis e provavelmente mais graves.

“O Judiciário não pode, com sua inação, abrir espaço para quem o socorra. É justamente em situações como esta que se deve privilegiar o papel do juiz da causa, a quem cabe avaliar em cada caso concreto a aplicação, em dosagem adequada, seja do princípio da insignificância, seja o princípio constitucional da individualização da pena”. (BRASIL. STF, 2015, online)

Nos três HCs citados acima os réus arguiram a bagatela como forma de absolvição, entretanto, não foi apreciado por conta deles serem reincidentes ou por praticarem o crime na sua forma qualificada.

A problemática se encontra quando não estão presentes tais pressupostos, em outras palavras, apenas a prática de furto. É claro que cada caso tem sua peculiaridade, no entanto, crimes poderão ser acobertados injustamente pelo princípio em questão. Zaupa (2010, online) se manifesta neste sentido:

A ofensa – no caso do furto, por exemplo – abala sim o ordenamento jurídico, pois a subtração vedada pela norma penal, visa à proteção do bem jurídico que possui valor para o indivíduo em si (a vítima) e para a sociedade (que também tem o desejo de poder possuir e gozar de seus bens, muitas vezes obtidos por esforços laborais ou por razões valorativas outras, sem ser molestada nesse direito que a legislação lhe garante).

Assim, ainda no exemplo dado, o furto de bens, ainda que de pequenos valores, afeta a ordem jurídica vigente, à medida que põe em abalo a efetividade das normas que são, em tese, a condensação da vontade da sociedade, através do processo legislativo que edita em leis os valores que essa própria sociedade tem como válidas (“não irás subtrair os bens dos outros”) e as quer para si (assim, não furte objeto de ninguém, seja qual o valor, pois há em cada objeto, por pertencer a algum, algum valor para quem se organizou em o ter).

Podemos perceber que o autor acima visa dar ênfase à efetivação da norma e em sua aplicabilidade, que, certamente, se contrapõe ao princípio da bagatela. Existem vários fatores que justificam os dois lados, como por exemplo: a soberania da lei, de um lado, e a questão da razoabilidade, de outro.

O que não pode prevalecer, portanto, é o abuso e a má-fé no uso do paradigma em questão, pois sua finalidade acaba por estar comprometida, dando espaço para condutas criminosas.

Com efeito, é necessário observar essa problemática perante os casos concretos, senão, o princípio da insignificância perderá seu controle e seu verdadeiro sentido.


Referências

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 123108 – MG. Partes: José Robson Alves. Relator: Min. Roberto Barroso. Minas Gerais. 28 de agosto de 2014a.

______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 123533 – SP. Partes: Jéssica Taiane Alves Pereira e outros. Relator: Min. Roberto Barroso. São Paulo. 5 de agosto de 2014b.

______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 123734 – MG. Partes: Leandro Fellipe Ferreira Souza e outros. Relator: Min. Roberto Barroso. Minas Gerais. 28 de agosto de 2014c.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Notícias STF. Aplicação do princípio da insignificância deve ser analisada caso a caso. Brasília, DF: Praça dos Três Poderes, 2015. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=296835>. Acesso em: 12 ago. 2015.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Notícias STF. Plenário inicia julgamento sobre aplicação do princípio da insignificância. Brasília, DF: Praça dos Três Poderes, 2014. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=281650>. Acesso em: 12 ago. 2015.

ZAUPA, Fernando Martins. O princípio da insignificância como instrumento de descrédito do sistema legal e fomento ao sentimento de impunidade. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2593, 7 ago. 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/17127>. Acesso em: 18 ago. 2015.

 

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Contratos de uso temporário de imóveis

Redação Direito Diário

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Atualmente, as plataformas digitais oferecem serviços de toda a natureza, facilitando a vida cotidiana. Por meio de aplicativos, é possível escolher, em detalhes, onde você gostaria de se hospedar na sua próxima viagem. Afora os benefícios para os viajantes, o uso temporário do imóvel é outro modo de obtenção de renda para os proprietários de imóveis. Essa modalidade surgiu nos idos de 2008, nos Estados Unidos, prometendo rapidez e segurança para viajantes e proprietários de imóveis. E esse é um ponto muito positivo para os usuários desse tipo de alojamento.

Entretanto, a natureza da contratação e a intensa rotatividade de hóspedes, em curto espaço de tempo, gera discussões sobre a relação entre hóspedes e os condomínios residenciais.  O trânsito extraordinário de pessoas não residentes dentro dos condomínios tem sido objeto de reclamação dos moradores porque os hóspedes, muitas vezes, não conhecem e não se sentem obrigados a cumprir as regras condominiais quanto ao uso do imóvel e horário de silêncio, por exemplo.

Segundo recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, a contratação de uso temporário de imóveis, via plataformas digitais, assemelha-se aos serviços de hotelaria, não aos de locação. Nesse sentido, a decisão do STJ foi no sentido de que o condomínio poderá convencionar, por meio de assembleia, a regulação ou a vedação dessa contratação temporária.

O tema está longe de se pacificado, pois, aparentemente, opõe a exploração econômica ao direito de propriedade e ao sentido constitucional de que a propriedade é protegida pelo ordenamento jurídico tão somente enquanto possuir uma função social. Nesses casos, me filio à segunda hipótese.

Mais informações: https://youtu.be/flsKs_3mS3M

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A polêmica Portaria Ministerial 620

Redação Direito Diário

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A recente Portaria nº 620, de 01-11-2021, do Ministério do Trabalho e Previdência, chegou cheia de polêmicas. Isso porque normatizou, a nosso juízo de forma equivocada, entre outras, a proibição do empregador de exigir a carteira de vacinação dos empregados ou, então, de demiti-los por justa causa por não terem se vacinado.

A primeira pergunta que qualquer operador do Direito faria é a de saber a razão da edição dessa norma e a quem ela se dirige. E a quem ela se dirige mesmo? Ainda não encontramos qualquer razão jurídica para a proteção do interesse público a que a saúde coletiva se refere.

A portaria contém vários “considerandos” que funcionam como justificativas à edição da norma. Com o respeito devido, o elenco das justificativas não se ajusta ao objeto da normatização.

Ultrapassado esse ponto, o que se admite apenas para argumentar, o instrumento escolhido não se presta à normatização de relações de trabalho. A portaria não integra os instrumentos do processo legislativo previsto no artigo 59 da Constituição Federal. E nem poderia, porque a natureza das Portarias Ministeriais é a de ato administrativo regulatório interno. Por isso, sem efeitos externos, tampouco com eficácia de lei.

Não fossem esses argumentos básicos e insuperáveis, haveria, aqui, um aparente conflito de interesses da sociedade: de um lado o alegado direito à liberdade e, de outro, o direito à saúde coletiva. Ambas as garantias constitucionais devem ser compreendidas e compatibilizadas no seu real sentido.

O alegado direito à não vacinação – como derivado da liberdade – que fundamentaria o que a portaria define como prática discriminatória, não é absoluto. Portanto, não pode ser traduzido como a garantia ao indivíduo de fazer o que bem entender. O princípio da legalidade é o balizador da garantia à liberdade: ao cidadão é lícito fazer tudo aquilo que não foi objeto de proibição legal. Tampouco configura liberdade o atuar que poderá gear efeitos a terceiros.

Tal alegado direito à não vacinação contra a SARS-COV2 impõe ônus aos indivíduos. No caso concreto, resta preservado o direito à liberdade, mas sujeito às proibições sociais decorrentes da sua opção.

Do outro lado, há o direito universal à saúde, que engloba, por evidência, a política sanitária. Considerada a pandemia que assola o mundo, as medidas sanitárias que visam a minimizar, senão eliminar, a circulação do vírus. Com isso, protegerá a todos, vacinados e não vacinados.

Aliás, essa discussão é infértil, porque as vacinas são de prática obrigatória na maioria dos países, sem que isso viole o direito à liberdade. Esse, justamente por não ser absoluto, será sombreado sempre que o interesse público estiver presente, como é o caso. Ou seja, na ponderação dos direitos, prevalece – pela proteção a todos – a proteção à saúde.

Polêmica, a portaria parece ter vida curta, pois as Cortes Judiciárias, em outras situações, têm se posicionado em favor da vida.

Mais informações: https://www.youtube.com/watch?v=PnqlsS-xaFc

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Todos os meses são cor de rosa

Redação Direito Diário

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O mês de outubro é rosa, mas todos os dias do ano devem ser também. O mês de outubro marca o período de conscientização para o diagnóstico precoce do câncer de mama.

As chances de cura de patologias malignas são grandes quando o diagnóstico é feito no estágio inicial. Os exames de rotina nos auxiliam nesse processo, já que a doença não escolhe gênero, idade, etnia, profissão, religião ou time de futebol. O câncer também não é somatização de mágoas, como alguns desinformados insistem em afirmar.

Receber o diagnóstico de câncer não é fácil. Também não precisa ser entendido como uma sentença de morte, até porque não é. Os inúmeros tratamentos existentes e em constante evolução, bem como as visitas aos médicos e realização de exames preventivos são as armas que temos para enfrentar a doença. Caso você esteja passando por este problema, procure se informar e se familiarizar com o mundo oncológico. É uma excelente forma de você tomar pé da situação e levar esse período temporário de forma mais leve e consciente.

A título ilustrativo, seguem algumas informações interessantes sobre o assunto.

É importante saber que tramita no Congresso Nacional o projeto de lei que institui o Estatuto da Pessoa com câncer que pretende otimizar o acesso aos tratamentos e medicamentos e demais direitos dos pacientes.

Atualmente, os pacientes com câncer, se empregados da atividade privada, possuem o direito ao saque do Fundo de Garantia e ao auxílio-doença, mediante apresentação de laudo médico. Todos os empregados possuem direito ao PIS/Pasep. Aqueles que recebem aposentadoria ou pensão possuem o direito à isenção de pagamento ao imposto de renda. Ainda com relação a impostos, em caso de deficiência ou invalidez, avaliada pelo órgão técnico e dependendo das legislações específicas, o paciente poderá requerer a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI e do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores-IPVA para a compra de veículos adaptados.

Nas situações previstas em lei, com cláusula específica em contrato habitacional, o paciente poderá buscar a quitação do financiamento do seu imóvel, financiado no Sistema Financeiro de Habitação.

Com relação ao atendimento pelo Sistema Único de Saúde, importante referir a “Lei dos 60 dias”, que obriga a instituição oferecer ao paciente a primeira etapa do tratamento nesse prazo. Aliás, os tratamentos oferecidos pelo SUS são muito semelhantes àqueles fornecidos pelos planos de saúde, o que é um alento.

Caso seja derrubado o veto presidencial, logo os pacientes oncológicos, nas situações previstas em lei, poderão substituir a quimioterapia intravenosa por quimioterapia oral, segundo a indicação médica.

Mas a pergunta que resta é: como acessar esses direitos sociais? Na maioria dos hospitais há uma equipe multidisciplinar que poderá auxiliar os pacientes, não apenas no tratamento da doença, mas também na orientação sobre os direitos dos pacientes com câncer.

Outro aspecto importante é procurar junto às instituições hospitalares ou em organizações não governamentais orientação psicológica, grupos de apoio e atividades próprias para os pacientes. A autoestima dos pacientes com câncer, inseridos em grupos de apoio, faz toda a diferença. São poucas as instituições desta natureza, mas, caso esteja em Porto Alegre, não deixe de procurar a Casa Camaleão.

Faça o seu tratamento, siga as orientações de todos os seus médicos, leve sua vida normalmente de modo bem colorido, de janeiro a janeiro.

Mais informações: https://youtu.be/nZdw-RsvdHY

Andrea Teichmann Vizzotto Advocacia

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