A justiça brasileira é lenta e isso não é nenhuma novidade. Surpresa, contudo, é saber que a maioria das pessoas e dos críticos atribuem que o motivo da ineficiência do judiciário é o volume de processos. Na verdade esse não é o problema principal e nem tampouco passa perto da raiz do problema. A razão da lentidão, da ineficiência e das demais outras críticas vai muito além disso e a Justiça Privada é a solução.
O fato é que o motivo está escancarado. A cada dia ele se torna cada vez mais verdadeiro, pois todos os dias o judiciário falha em prestar adequadamente a “justiça ideal” que a Constituição Federal propôs garantir. A “razoável duração do processo”, a “celeridade processual” são utopias tão bem contadas e de conceitos extremamentes maquiados, que oculta a verdade: o Estado não consegue (e nunca conseguirá) prover isso.
A raiz do problema é extensa e profunda, mas, sem dúvidas ela começa no monopólio estatal sobre a justiça. A ideia de que somente o Estado pode fazer existir e concretizar direitos e, portanto, fazer leis para tão somente aplicá-la é algo que está ficando aos poucos para trás sem percebermos. Todavia, acreditar e imaginar outra possibilidade diferente disso é algo ainda difícil para as pessoas. Os ideais do Estado Social ainda são muito fortes. É inconcebível, por exemplo, cogitar sobre levar uma causa a um tribunal privado. O que? Quer dizer que o juiz da minha causa vai ser privado? Nem pensar!
O Estado Social é fortemente defendido por argumentos poderosos, tais como: “ele veio para garantir o bem estar social” ou que “ele é resultado de uma evolução histórica, pois é a união entre dois ideais: o liberalismo e socialismo”. Os argumentos são poderosos, mas a revelação deles na prática tem um preço alto (inclusive nos bolsos dos “contribuintes”).
Além disso, a visão de que o welfare state é o correto, “porque é a evolução ou aprimoramento no curso da história” é uma falácia non sequitur. Primeiro, desde quando as sequências futuras dos acontecimentos históricos são evoluções no sentido de aprimoramento? Há um erro semântico por aqui, vez que se confunde a “evolução” no sentido de “seguimento” com a “evolução” no sentido de “melhoramento”. Em segundo, justifica-se a sua infalibilidade de acordo com a falsa premissa de que ele é uma evolução histórica. Então, só porque o Estado Social é uma etapa da história humana, não significa que seja o melhor caminho. Só pelo fato de ser “seguinte” não é um argumento plausível.
Bom, não é a intenção deste artigo desconstruir totalmente tal modelo de estado, pois não é o espaço apropriado. Na verdade a intenção é demonstrar que ele não é a melhor solução e que os direitos não existem por causa do estado, mas apesar dele. O Direito existe desde que havia dois seres humanos coexistindo no mesmo espaço e se relacionando voluntariamente (ou não), pois foi a partir desse momento em que os conflitos surgiram. As coisas são escassas, o que obrigou que medidas fossem tomadas a partir de tais relações. Ainda que tudo ao nosso redor fosse infinito, ainda sim existiriam duas coisas escassas: você e o espaço. Isso é o suficiente para existir conflitos. Foi a partir das ações humanas que os primeiros contratos e leis, em suas formas mais primitivas, surgiram.
Critico, portanto, a afirmação de Carnelutti (2005, p. 14) de que “somente é possível entender o que é Direito, se entendermos primeiro o que é Estado”, sendo que na página seguinte, é afirmado que “o Direito existe desde que o mundo é mundo”. Ora, se o Direito existe desde que o “mundo é mundo e, enquanto o mundo seja mundo, deverá existir”, porque eu só consigo entendê-lo se primeiro saber o que é Estado, algo que só surgiu muitos anos depois do desenvolvimento da agricultura?
É com esses questionamentos que enxergo a atual situação da justiça brasileira. Um monopólio do estado falido, perdido na ineficiência e tentando, inutilmente, correr contra o tempo para salvar alguma coisa. Isto é, quando os servidores realmente estão comprometidos com o seu trabalho, algo incomum e raro. Por mais que digitalizem os processos, que se crie mais varas e que haja mais concursos, a situação jamais mudará. A mentalidade é sempre a mesma: “faça um concurso porque quando você passar, não vai precisar mais trabalhar”. Essa é a verdade que impera em nossa sociedade, principalmente nas faculdades de direito. Não há incentivos reais para servidores públicos trabalharem com comprometimento. Ressalto que existem exceções.
Portanto, a solução é abrir caminho para a Justiça Privada. Aos Tribunais Arbitrais. É difícil de aceitar isso? Eu imagino, até porque isso impacta na cultura brasileira, no entanto há fundamentos para esse ser o próximo passo. Veja o Novo Código de Processo Civil reconhecendo que deve-se dar mais liberdade às partes através do Negócio Jurídico Processual (art. 190, NCPC, online), além de insistir nos institutos da conciliação e mediação. A própria iniciativa privada está criando maneiras de solucionar conflitos em sites de negócios (e-bay, reclame aqui, mercado livre, v.g) para evitar o Estado. Mesmo com essas mudanças, ainda sou cético em acreditar que o Negócio Jurídico Processual será aplicado por excelência. Ele depende da justiça estatal: do ritmo da secretaria, da vontade do juiz e de vários outros fatores. No entanto, sem dúvidas é um dos primeiros passos.
Somente dando mais liberdade para a Justiça Privada e tirando o peso das regulações (tal como era nos EUA antes de 1920), pode-se resolver o problema da caríssima e desgastante justiça brasileira. Somente ela pode garantir a celeridade processual e a razoável duração do processo em condições palpáveis e concretas. Haverá incentivos para isso. A área privada gera incentivos. Esse sem dúvidas é o primeiro passo para mudar a atual situação e, inclusive, diminuir consideravelmente o tamanho do Estado. Encerro o presente texto com a seguinte citação, ainda muito próxima da nossa realidade, de Rothbard (2013, p. 264):
Deveríamos todos estar mais habituados com o uso crescente da arbitragem ou mediação privada, até mesmo em nossa sociedade atual. Os tribunais do governo se tornaram tão sobrecarregados, ineficientes e dispendiosos que cada vez mais as partes envolvidas estão recorrendo a mediadores privados como uma forma mais barata e menos demorada de resolver suas disputas. Nos últimos anos, a mediação privada tem se tornado uma profissão crescente e altamente bem sucedida. […], por ser uma ocupação voluntária, as regras da mediação podem ser decididas rapidamente pelas próprias partes envolvidas, sem a necessidade de uma estrutura legal complexa e enfadonha que deve ser aplicada a todos os cidadãos. A mediação […] permite que os julgamentos sejam realizados por pessoas que tenham conhecimentos específicos na atividade ou ocupação envolvida no caso.
E então? O que você está esperando para investir nessa solução, muito dita pelos atuais juristas como “o futuro do Direito”? O que você está esperando para abrir uma sala de mediação com um advogado? Ou até mesmo tornar-se um juiz arbitral?
Referências: BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, Senado Federal, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acessado em: 31 mar. 2017. CARNELUTTI, F. A Arte do direito. 2º. ed. Campinas: Bookseller, 2005. Créditos da imagem disponível em: <http://saberalei.com.br/wp-content/uploads/2015/04/Acordo-trabalhista.jpg> ROTHBARD, M. Por uma nova liberdade: O manifesto libertário. 1º. ed. São Paulo: Instituto Mises Brasil, 2013.
Muito bom seu artigo. No início do 3º parágrafo já desconfiei que se tratava de um texto escrito por algum libertário. Então nem me surpreendi quando vi a citação de Rothbard logo depois.
Sucesso.