O caráter de imparcialidade é inseparável do órgão da jurisdição. O juiz coloca-se entre as partes e acima delas: esta é a primeira condição para que possa exercer sua função dentro do processo. A imparcialidade do juiz é pressuposto para que a relação processual se instaure validamente. É nesse sentido que se diz que o órgão jurisdicional deve ser subjetivamente capaz. (CINTRA e col. Teoria Geral do Processo, 2007, p. 58)
Um dos principais alicerces que está presente e sustenta o direito processual é a imparcialidade do juiz. Sem a imparcialidade é impossível sequer buscar a justiça, vez que as decisões restariam comprometidas. O objetivo deste texto é exaltar a importância da impessoalidade sobre as relações processuais.
Ao solicitar o provimento jurisdicional, o autor está exercendo seu direito de ação que é envolvido pelos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório; e claro: o princípio da imparcialidade do magistrado.
Infelizmente e infortunadamente existem situações em que nos deparamos com o desrespeito desse princípio. Seja porque o autor, inflamado em processar o réu, combina com o juiz (que é amigo ou parente) em fazer com que o processo tramite em sua secretaria, seja para tentar combinar com ele sobre o rumo da sentença. É importante destacar que não significa nada de útil se uma das partes e o juiz estão em conluio contra determinado sujeito processual.
Ser amigo ou parente de alguém que exerce a função de autoridade pública não dá poder a ninguém, afinal a Constituição é clara em afirmar que o Brasil é um estado democrático de direito. Somos todos iguais perante a lei, sem distinção de raça, cor, religião, etc.
O juiz não é alguém, é uma função impessoal que é exercida. Quem o assume tem deveres e responsabilidades que devem ser cumpridas. Se ele carece de imparcialidade, o pressuposto de validade processual resta prejudicado, trazendo conseqüências previstas em lei.
Mesmo com o desrespeito ao impessoal, ainda é possível encontrar juízes que se negam a aceitar a realidade e declarar sua parcialidade. Fazem um esforço para não dar o braço a torcer. Embora inútil suas negativas, acaba por atrasar o devido andamento processual.
Porém, nada está perdido: o impedimento e a suspeição são institutos próprios para resolver essa questão de parcialidade que estão previstos de maneira restritiva nos artigos 134 e 135 do CPC, respectivamente. A diferença entre os dois é perceptível, embora parecidos.
O impedimento trata de assuntos graves e insanáveis, configurando presunção absoluta de parcialidade do juiz. É matéria de ordem pública, portanto não é objeto de preclusão, isto é, não há prazo para alegar tal instrumento. Segue abaixo os casos em que ela se verifica:
Art. 134. É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:
I – de que for parte;
II – em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha;
III – que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido sentença ou decisão;
IV – quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau;
V – quando cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau;
VI – quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.
Parágrafo único. No caso do no IV, o impedimento só se verifica quando o advogado já estava exercendo o patrocínio da causa; é, porém, vedado ao advogado pleitear no processo, a fim de criar o impedimento do juiz. ( BRASIL, 1973, online)
O Novo Código de Processo Civil prevê tal instituto no Artigo 144, acrescentando alterações para aumentar a rigidez. Vejamos (grifo nosso):
Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
[…]
III – quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
[…]
VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;
[…]
§ 3º O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo. (BRASIL, 2015, online)
Percebe-se que o código busca adotar uma postura rigorosa e severa nesses casos para garantir a imparcialidade.
A suspeição, todavia, é bem diferente. Ela não é tão grave e nem objetiva quanto os casos de impedimento. Sua presunção é relativa de parcialidade, além de que é caracterizada por uma discussão subjetiva sobre a posição do magistrado. Segue abaixo o dispositivo:
Art. 135. Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando:
I – amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes;
II – alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau;
III – herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes;
IV – receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio;
V – interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.
Parágrafo único. Poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo. (BRASIL, 2015, online)
Ela é mais difícil de ser provada por conta desse aspecto, necessitando de discussão por via de exceção (de acordo com o Artigo 305 do CPC). Embora o Código de Processo Civil vigente determine que o prazo seja de 15 dias a contar do acontecimento do fato que ocasionou a suspeição, tal entendimento não prevalece, pois, em regra, o juiz é imparcial. As partes não esperam imparcialidade, além de que elas não têm como saber sobre o exato acontecimento do acontecimento.
Assim, prevalece que o prazo tem início de contagem a partir da ciência do fato. O NCPC, inclusive, alterou a dissertação para a forma acertada, apesar de pecar em empurrar prazo para impedimento, que é matéria de ordem pública e não sujeita à preclusão, conforme já vimos. Segue abaixo (grifo nosso):
Art. 146. No prazo de 15 (quinze) dias, a contar do conhecimento do fato, a parte alegará o impedimento ou a suspeição, em petição específica dirigida ao juiz do processo, na qual indicará o fundamento da recusa, podendo instruí-la com documentos em que se fundar a alegação e com rol de testemunhas. (BRASIL, 2015, online)
A suspeição, em regra, se tratada com indiferença pela parte interessada, ou seja, se ela não for alegada, o processo seguirá em frente e tal potencial de vício será convalidado. Isso não significa que não seja objeto de impedimento caso tome proporções maiores, nem de suspeição, se as situações taxadas no Artigo 135 (CPC) e 145 (NCPC), se repetirem.
Referencias:
BRASIL. Código de Processo Civil de 1973. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Palácio do Planalto Presidência da República, 1973. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>. Acesso em: 05 jan. 2016.
BRASIL. Novo Código de Processo Civil de 2015. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Palácio do Planalto Presidência da República, 2015. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 05 jan. 2016.
CINTRA, Antonio Carlos; PELLEGRINI, Ada; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo. 23ª ed. Malheiros Editores, 2007. p. 58.
Portal Educação, Da suspeição e do impedimento do juiz no processo civil. Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/direito/artigos/59441/da-suspeicao-e-do-impedimento-do-juiz-no-processo-civil>. Acesso em: 05 jan. 2016.