O quadro societário de qualquer empresa é passível de diversas modificações. Dentre estas, uma das mais corriqueiras é a saída de um membro da sociedade, de modo que é frequente a dúvida acerca da responsabilidade do ex-sócio ou “sócio retirante” em relação às dívidas, sobretudo as de natureza trabalhista, contraídas pela empresa da qual fazia parte.
Responsabilidade Limitada
Primeiramente, é preciso compreender que a figura do sócio não se confunde com a da sociedade, isto é, suas personalidades jurídicas são distintas. Ademais, os sócios possuem responsabilidade limitada aos valores de suas respectivas quotas, o que, na prática, implica dizer que o patrimônio particular dos membros da sociedade, em regra, não deve responder pelas dívidas contraídas pela empresa, uma vez que esta, no Brasil, é constituída sob a forma de sociedade limitada na maioria dos casos.
Estabelecido esse pressuposto, é fácil perceber que é a empresa – e não os sócios, muito menos o retirante – que deve arcar com os débitos trabalhistas. O problema surge, contudo, quando a sociedade não dispõe de patrimônio suficiente para adimplir as mencionadas dívidas.
Empresa insolvente
Nessa situação, é comum que a empresa seja demandada na Justiça do Trabalho e que o reclamante faça o pedido de desconsideração da personalidade jurídica com o fito de que a responsabilidade dos sócios torne-se ilimitada.
Em outras palavras, o pleito do autor tem o objetivo de que o patrimônio particular dos sócios passe a responder pelos débitos que, a princípio, diziam respeito apenas à sociedade. Porém, poderia o reclamante pleitear que os bens do sócio retirante também respondessem pela dívida objeto da ação?
Pense-se em um exemplo mais palpável: um sócio retirou-se formalmente da empresa em 20 de fevereiro de 2014. Cinco anos depois de sua saída, foi surpreendido com a penhora de um de seus imóveis em decorrência de uma reclamação trabalhista em face da sociedade que integrava, em razão de um débito cuja origem era posterior à data de 20/02/2014. A penhora do bem realmente poderia acontecer?
Regras para a responsabilização do sócio retirante
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), graças à recente reforma pela qual passou, passou a disciplinar a responsabilidade do sócio após o seu desligamento da empresa da qual fazia parte. Conforme a aludida legislação, o ex-sócio só responde pela dívida trabalhista caso esta preencha as seguintes condições:
- Origem em data na qual o sócio retirante ainda figurava como membro da sociedade;
- A ação que busca satisfazê-la deve ter sido ajuizada em até dois anos após o sócio sair formalmente da empresa.
Percebe-se, portanto, a enorme importância de se fixar o momento exato em que o sócio deixa de ser considerado como tal. A legislação civil estabelece que isso ocorre com a averbação, isto é, com o registro da modificação do contrato social no órgão estatal competente (Junta Comercial).
Ademais, a responsabilidade do ex-sócio é subsidiária, ou seja, há de se observar uma ordem de preferência na execução:
- Patrimônio da sociedade devedora;
- Bens dos sócios atuais;
- Patrimônio do sócio retirante, desde que frustrada a satisfação do débito nas duas hipóteses anteriores.
Excepcionalmente, a responsabilidade será solidária, ou seja, sem o benefício de ordem acima descrito, na hipótese em que reste comprovada fraude na alteração do contrato social decorrente da saída do sócio retirante.
Dessa forma, no exemplo construído anteriormente, tem-se que a penhora do imóvel deve ser cancelada, tendo em vista que a dívida trabalhista tem origem em momento posterior à saída do sócio retirante da empresa.
Considerações finais
Em síntese, o sócio que se retira da empresa não fica desde logo isento de qualquer responsabilidade em relação às dívidas trabalhistas da sociedade.
Até dois anos após a averbação da alteração do contrato social decorrente da sua saída, o patrimônio do ex-sócio ainda poderá responder pelos débitos trabalhistas da empresa, desde que estes tenham origem no período em que o retirante ainda era membro da sociedade e que a satisfação da dívida tenha sido frustrada tanto na execução dos bens da empresa quanto na do patrimônio dos sócios atuais.