Como resultado da aprovação do projeto de lei 479/2012, também conhecido como Marco Legal do Combate ao Tráfico de Pessoas, foi sancionada a Lei 13.344, que dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas, em outubro de 2016.
Essa nova legislação foi resultado da necessidade de adequação do ordenamento jurídico brasileiro às convenções internacionais sobre tráfico de pessoas, em especial ao Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Este protocolo foi criado pelo comitê intergovernamental da Assembleia Geral da ONU e aprovado no ano 2000.
O Protocolo, no seu artigo 3º, define como tráfico de pessoas:
“o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso de força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra, para fins de exploração”
Até então, os arts. 231 e 231-A do Código Penal Brasileiro, de forma antiquada, penalizava o tráfico de pessoas somente se tivesse por finalidade a exploração sexual da vítima. Todavia, o conceito da palavra exploração foi ampliado pela convenção internacional, passando a abranger: a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, os trabalhos ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.
A Lei 13.344/16 foi editada com a finalidade de conceber essa maior proteção ao indivíduo e criminalizar outras condutas. Objetivando alcançar esse intento, o legislador revogou os artigos do CP mencionados acima e passou a tratar do assunto no art. 149-A do mesmo código, que faz parte no capítulo de crimes contra a liberdade individual e possui a seguinte redação:
Art. 149-A. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:
I – remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;
II – submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;
III – submetê-la a qualquer tipo de servidão;
IV – adoção ilegal; ou
V – exploração sexual.
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
1oA pena é aumentada de um terço até a metade se:
I – o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las;
II – o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência;
III – o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou
IV – a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.
2oA pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.
Importante observar que o crime será considerado consumado se o agente tiver apenas a finalidade de realizar qualquer um dos oitos núcleos específicos constantes nos incisos acima.
Outra modificação legislativa de grande destaque e que tem causado alguns debates é aquela relacionada aos arts. 13-A e 13-B do Código de Processo Penal.
O primeiro dispositivo permite que o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia possa requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos, sem necessidade de fazer esse pedido primeiramente ao juiz.
Já o segundo artigo permite que, mediante autorização judicial, o membro do MP ou o delegado de polícia requisite às operadoras telefônicas os dados que permitam localizar os suspeitos ou as vítimas do crime.
Em janeiro de 2017 a Associação Nacional das Operadoras de Celulares ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF, impugnando a constitucionalidade da lei e afirmando que esses dispositivos violam a proteção das comunicações ao permitir o acesso de dados sem necessidade de autorização do Poder Judiciário.
Uma dúvida que pode surgir é se o tipo penal é aplicado aos casos em que há consentimento da suposta vítima. O ordenamento jurídico brasileiro adotou a tese de que o consentimento é válido desde que não haja grave ameaça, violência, coação ou fraude, abuso de autoridade. Também não será válido se o ofendido que consentir for vulnerável ou se esse ato se realizar mediante contraprestação.
Por fim, pela a análise dos seus arts. 4º ao 6°, entende-se que a nova legislação possui algumas linhas de frente, a saber: busca prevenir e reprimir o tráfico de pessoas, bem como proteger e dar assistência às vítimas.
Bibliografia Tráfico de pessoas: da Convenção de Genebra ao Protocolo de Palermo http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/trafico-de-pessoas/artigo_trafico_de_pessoas.pdf Lei 13.344, de 06 de outubro de 2016; Dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas. Disponível em:http://www.1.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13344.htm Imagem disponível em: http://www.megajuridico.com/trafico-de-pessoas-interno-e-internacional/