O presente artigo objetiva trazer à baila questões sobre as normas e as exigências que devem ser seguidas pelos, comumente conhecidos, Food Trucks (“caminhões de comida”), que ganharam fama e uma presença crescente nos últimos anos aqui no Brasil.
Não podemos ignorar que a presença da venda de alimentos em carros, carrinhos de ambulantes e outros congêneres não é uma novidade no nosso país. Na Capital Alencarina não é muito difícil se deparar à noite com: vendedores de espetinhos; pipoqueiros; exemplares do veículo Asia Motors Towner (os famosos “carrinhos de cachorro-quente” da década de 1990) servindo sanduíches e similares.
Antes de termos os Food Trucks, a “comida de rua” no Brasil já existia há tempos. É bem verdade que o uso de um termo de origem inglesa remete à ideia um modelo de negócios que tem como fim a comercialização de alimentos do tipo “comida de rua” (sanduíches, frutas, massas ou quaisquer outros que possam se enquadrar nessa categoria).
A impressão que se tem é de que alimentos produzidos dentro deste tipo de modelo de negócios serão saborosos e – mesmo que servidos fora de um estabelecimento convencional como um restaurante – terão uma higiene adequada. Acontece que a produção de qualquer alimento para fins comerciais precisa seguir padrões de higiene em adição aos preceitos das normas legais necessárias para o funcionamento regular do “estabelecimento móvel”.
Caso o empreendedor esteja em vias de se aventurar neste tipo de negócio, é importante saber quais normas se aplicam a quais aspectos da sua atividade.
O REGIME DA PESSOA JURÍDICA
Esta questão vai depender essencialmente do faturamento planejado para a opção entre o Microempreendedor Individual (MEI) ou Microempresa. Quanto ao primeiro, temos o disposto no Art. 91 da Resolução Comitê Gestor do Simples Nacional nº 94, de 29 de novembro de 2011 que:
Considera-se Microempreendedor Individual – MEI o empresário a que se refere o art. 966 da Lei n º 10.406, de 2002, optante pelo Simples Nacional, que tenha auferido receita bruta acumulada nos anos-calendário anterior e em curso de até R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) e que: (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 18-A, § 1 º e § 7 º , inciso III)I – exerça tão-somente as atividades constantes do Anexo XIII desta Resolução; (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 18-A, §§ 4 º -B e 17)II – possua um único estabelecimento; (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 18-A, § 4 º , inciso II)III – não participe de outra empresa como titular, sócio ou administrador; (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 18-A, § 4 º , inciso III)IV – não contrate mais de um empregado, observado o disposto no art. 96. (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 18-C).
Quanto ao segundo, temos o disposto na alínea (a) do inciso I do art. 2o também da Resolução Comitê Gestor do Simples Nacional nº 94, de 29 de novembro de 2011 que:
Microempresa (ME) ou empresa de pequeno porte (EPP) a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada ou o empresário a que se refere o art. 966 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, e a sociedade de advogados registrada na forma do art. 15 da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, desde que: (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 3º, caput; art. 18, § 5º-C, VII) (Redação dada pela Resolução CGSN nº 117, de 2 de dezembro de 2014) (Vide art. 10 da Res. CGSN nº 117/2014). a) no caso da ME, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais); (Lei Complementar n º 123, de 2006, art. 3 º , inciso I) (…)
O planejamento contábil aliado com as expectativas de faturamento do empreendedor devem estar harmonizados em um primeiro momento para o registro da pessoa jurídica. É bom frisar que é possível a mudança do regime tributário caso o faturamento mude. Para exemplificar: caso um MEI venha a faturar R$120.000,00 (cento e vinte mil reais) no último ano-calendário, está claro que houve a ultrapassagem do respectivo teto estabelecido (se desenquadrando de um dos requisitos para ser um Microempreendedor Individual).
É de bom alvitre ter em mente que há outros requisitos para o estabelecimento da pessoa jurídica que devem ser observados para saber qual a mais adequada. Porém, a análise de outros requisitos deve ser feita diante de um caso concreto em um momento mais oportuno.
DAS CONDIÇÕES DO VEÍCULO
Para que um Food Truck possa assim ser considerado, é necessário que o veículo escolhido passe por uma reforma para que possa atender necessidades inerentes do serviço. Para tanto, é importante procurar o DETRAN para obter a autorização para realizar modificações, como dispõe o art. 98 da Lei n. 9.503/97:
Nenhum proprietário ou responsável poderá, sem prévia autorização da autoridade competente, fazer ou ordenar que sejam feitas no veículo modificações de suas características de fábrica.
É importante procurar uma oficina que saiba trabalhar em acordo com as normas da ANVISA e do INMETRO. Algumas modificações podem vir pela necessidade da preparação/conservação do produto, mas é preciso que modificação atenda às exigências de segurança do Corpo de Bombeiros para prevenir quaisquer riscos de acidentes.
DOS REGULAMENTOS COM O MANEJO DE ALIMENTOS
Agora estamos diante da estrela do Food Truck: o alimento que é preparado e vendido pelo empreendedor! Existem regras dispostas por órgãos competentes para o manejo de qualquer que seja o produto alimentício (massas, sanduíches, espetos de carne, sorvetes, entre outros) bem como normas sobre condições sanitárias da estrutura do próprio “estabelecimento”. O objetivo é garantir ao consumidor que ele só irá ingerir produtos livres de quaisquer contaminações e dentro do prazo de validade.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) possui a Resolução RDC n. 216, de 15 de setembro de 2004, que “Dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação” bem como a Resolução RDC N° 49, de 31 de outubro de 2013, que “Dispõe sobre a regularização para o exercício de atividade de interesse sanitário do microempreendedor individual, do empreendimento familiar rural e do empreendimento econômico solidário e dá outras providências”.
É claro que os entes da Federação devem estabelecer outras normas de higiene que venham a complementar as exigências do órgão Federal.
DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PARA FOOD TRUCKS
Apenas em três capitais temos legislação para lidar com os Food Trucks. Em São Paulo, temos a Lei N. 15.947, de 26 de dezembro de 2013, que “Dispõe sobre as regras para comercialização de alimentos em vias e áreas públicas – comida de rua – e dá outras providências” e o respectivo Decreto n. 55.085, de 6 de maio de 2014, que a regulamenta.
No Rio de Janeiro, já havia um lei que tratava sobre alimentos vendidos por ambulante. No entanto, foi editado o Decreto n. 39.709 de 2 de janeiro de 2015, que regula especificamente o que sejam os “Food Trucks”.
Em Curitiba, a Lei n. 14.634 foi sancionada este ano que “Dispõe sobre a comercialização de alimentos em áreas públicas e particulares – ‘FOOD TRUCKS’” que foi regulamentado pelo Decreto n. 622 de 08 de julho de 2015.
Por hora, percebe-se que pouquíssimos são os municípios que possuem disposições específicas para esses alimentos servidos dentro de veículos ou trailers. Cada um desses exemplos jurídicos possui detalhes que diferenciam a regulamentação de um cidade para a outra.
CONCLUSÕES
Há uma série de exigências que precisam ser atendidas caso o empreendedor queria criar um Food Truck. Elas vão desde a constituição da pessoa jurídica mais adequada ao caso concreto até as regras mínimas de higiene para o trato com os alimentos.
É claro que o Estado não deve criar um nível de exigência tão alto que abuse a capacidade de legislar e de regulamentar para não sufocar a iniciativa privada. Planejamento e estudos são dois elementos que se devem pautar quem quer investir neste ramo do setor alimentício, pois sempre é bom pedir “um hambúrguer com pouca burocracia e menos carga tributária, por favor!”.