STF decide pela aplicação de tratado de extradição para delitos anteriores a sua celebração

Nesta segunda-feira, o Supremo Tribunal Federal manteve a prisão cautelar para fins de extradição do cidadão chinês Wanpu Jiang. Jiang é investigado em seu país pela suposta participação em um golpe financeiro que lesou mais de duas centenas de pessoas.

Na decisão, proferida na Prisão Preventiva para Extradição (PPE) 769, o ministro Celso de Mello rejeitou o argumento da defesa, que alegava não ser possível a extradição, tendo em vista que o crime cometido se deu antes da celebração do Tratado de Extradição entre Brasil e China, promulgado no Decreto 8.431, de 09 de abril de 2015, de modo que este não estaria vigente.

O Supremo entendeu ser possível o tratado internacional se aplicar a fatos criminosos ocorridos antes de sua celebração. Conforme o Ministro, essas convenções não tipificam crimes nem estabelecem penas, não constituindo lei penal. Dessa forma, não há vedação constitucional a fato anterior da legislação penal menos favorável. Em outras palavras, não se considera que haja uma violação ao princípio da anterioridade penal.

Em breves palavras, a extradição ocorre quando um Estado, a pedido de um país com o qual tenha relações internacionais, “devolva-lhe” seu nacional para que cumpra pena por um crime que lá tenha cometido. Portanto, não é o tratado de extradição celebrado pelos países que confere tipicidade ao crime. O ato delituoso já era assim definido pela legislação interna de ambos os países.

Além disso, o relator esclareceu que a questão é objeto da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, promulgada no Brasil pelo Decreto 7.030/2009. A Convenção referida condiciona a aplicação retroativa dos tratados internacionais ao comum acordo entre os Estados que o celebrem, e o Tratado de Extradição entre Brasil e China prevê expressamente essa possibilidade.

O Ministro também explicou que, mesmo não sendo possível conferir eficácia retroativa ao tratado, seria possível ainda formular o pedido, tendo como base o fundamento jurídico da promessa de reciprocidade, que é fonte formal do direito extradicional.

A defesa alegou também o fato de ele ser casado com uma brasileira e a inexistência de condenação contra o extraditando em seu país de origem. Todavia, a Súmula 421 do STF consolidou que o casamento ou a união estável não é impedimento para que seja realizada a extradição. Também já é considerada possível a extradição sem condenação, tendo base em investigação policial ou processo judicial em curso, desde que haja ordem de prisão expedida por autoridade estrangeira competente.

Conforme informou o Ministro-relator:

Não tem qualquer relevo jurídico o fato de inexistir, no momento, ‘sentença condenatória’ contra o extraditando, pois, como se sabe, o ordenamento positivo brasileiro e o tratado bilateral de extradição Brasil/China expressamente reconhecem a possibilidade de formulação de pedido extradicional de caráter meramente instrutório.

Por fim, a defesa também alegou que o crime praticado não cumpre o critério de dupla tipicidade, ou seja, não é considerado crime em ambos os Estados, um dos requisitos para que seja concedida a extradição. Contudo, o Relator considerou que o crime em questão, seria correspondente ao crime contra o sistema financeiro (artigo 16 da Lei 7.492/1986) e, até mesmo, estelionato (artigo 171 do Código Penal).

Referências:
CASSON, Tom. The Mockery of Extradition. Tom Casson Illustration, 16 de dezembro de 2010. Disponível em: <http://tomcassonillustration.blogspot.com.br/2010/12/mockery-of-extradition.html>. Acesso em 22 fev 2016.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tratado de extradição pode ser aplicado a delitos ocorridos antes de sua celebração. STF, 22 de fevereiro de 2016. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=310333>. Acesso em 22 fev 2016.
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