Maiores esclarecimentos sobre o crime de estupro

Inicialmente, algumas considerações precisam ser feitas sobre o tipo em epígrafe. De acordo com o art. 1º, V da Lei n° 8.072/90, estupro é um crime hediondo, tanto sua forma simples como qualificada. Crimes hediondos são aqueles identificados na Lei n° 8.072/90, a qual também apresenta o tratamento diferenciado e mais rigoroso que eles recebem. São, dessa forma, os crimes considerados de extrema gravidade, sendo inafiançáveis e insuscetíveis de graça, anistia ou indulto.

O núcleo do tipo é o verbo constranger, sendo utilizado no sentindo de forçar, coagir ou obrigar. Nesse sentido, observe-se (grifo nosso):

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

Dessa forma, são três as possibilidades de realização do crime de estupro: constranger alguém a ter conjunção carnal ou a praticar outro ato libidinoso ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. O agente pode, assim, realizar uma das condutas ou as três, desde que contra a mesma vítima, no mesmo local e horário, constituindo um só delito, cabendo ao juiz, no momento da dosimetria, levar esse quesito em consideração para calcular a pena.

Ademais, para que se configure o delito em estudo, é preciso que o agente atue mediante o emprego de violência ou de grave ameaça, consoante está descrito no caput do artigo. Ainda sobre o tema, esclarece-se que o tipo do artigo 213 prevê 4 (quatro) modalidades para sua imputação:

a) simples (caput);

b) qualificado pela lesão corporal de natureza grave (§ 1.º, 1.ª parte);

c) qualificado pela idade da vítima, menor de 18 e maior de 14 anos (parte final do § 1.º) e 

d) qualificado pela morte (§ 2.º).

Os resultados que qualificam o crime (morte e lesão grave) só serão considerados como agravantes se forem praticados a título de culpa, ou seja, crimes preterdolosos, caso contrário serão imputados como condutas distintas em concurso de crimes.

É importante esclarecer que não houve abolitio criminis em relação ao crime de atentado violento ao pudor (antigo artigo 214 do Código Penal). Com a reforma realizada pela Lei n° 12.015/09, a conduta do antigo artigo 214, atualmente, foi incorporada ao tipo de Estupro.

Apesar das divergências jurisprudenciais e doutrinárias que circundam o tema, o STF tem entendido que é possível o reconhecimento de crime único (tipo misto alternativo) entre o tipo de atentado violento ao pudor e estupro, não sendo mais o caso de concurso material de crimes, podendo ocorrer crime continuado se atender aos requisitos do art. 71. Sobre o tema:

EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. SUBSTITUTIVO DO RECURSO CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ROUBO QUALIFICADO. CONCURSO DE AGENTES. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CRIME ÚNICO. CONTINUIDADE DELITIVA. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 12.015/2009. COMPETÊNCIA DO JUIZ DA EXECUÇÃO. (…) A Lei nº 12.015/2009 unificou as condutas de estupro e de atentado violento ao pudor em tipo mais abrangente, de ação múltipla, ensejador da configuração de crime único ou crime continuado, a depender das circunstâncias concretas dos fatos. Cabe ao Juízo da Execução Penal aplicar à condenação transitada em julgado a lei mais benigna. circunstâncias concretas dos fatos. Habeas corpus extinto sem resolução do mérito, mas com concessão de ofício, para que o juízo da execução criminal competente proceda à aplicação retroativa da Lei 12.015/2009.” (grifo nosso)

(STF – HC: 106454 SP , Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento: 02/04/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-070 DIVULG 16-04-2013 PUBLIC 17-04-2013)

Neste jaez, apesar das muitas divergências que circundam o tema, atos ofensivos ao pudor, como passar a mão nas pernas da vítima ou a beijar, devem ser considerados como uma contravenção penal (Decreto-Lei nº 3.688), porém a ocorrência de beijo lascivo, praticado mediante o emprego de violência ou grave ameaça, deve ser considerada, de acordo com parte da doutrina e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ, como caso de estupro.

Por fim, tanto marido como mulher podem ser sujeito ativo e passivo do crime de estupro, não extinguindo a punibilidade o fato de estarem casados, se suas condutas se adequarem ao crime. A prostituta, também, pode ser vítima deste crime, tendo o livre-arbítrio de decidir sobre a prática de atos libidinosos ou não, não podendo ser forçada.


Referências

Art. 61. Importunar alguém, em lugar público ou acessivel ao público, de modo ofensivo ao pudor:

Pena – multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.


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