O árduo trabalho em comprovar a ocorrência do crime de Corrupção passiva

Atualmente, se perguntarmos, em uma sala com cem pessoas, qual é a maior causa dos problemas do Brasil, arriscaria dizer que, no mínimo, vinte pessoas responderiam prontamente que se trata do alto índice de corrupção no país.

De fato, a frequência da ocorrência desse crime é alarmante e os números não param de ser atualizados. Essa quantia torna-se ainda mais preocupante quando se leva em consideração os casos de corrupção que se consumam diariamente, mas que passam como irrelevantes penais. Isso, muitas vezes, advém da própria ontologia do dispositivo, uma vez que, inseridos na esfera da realidade, são muito difíceis de serem identificados e comprovados, para fins de punição.

Nesse sentido, é necessário, em um primeiro momento, analisarmos o dispositivo presente no art. 317 do Código Penal, inserido no Capítulo I do Título V, que disciplina os crimes praticados por servidores públicos contra a Administração em geral. Ao observar o texto normativo, deve ser tomada a cautela de separar mentalmente as duas previsões inseridas no artigo, a que se refere ao núcleo de “solicitar” e a que se refere ao ato de “receber”.

Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa

Retomando ao que estava sendo tratado, no que tange à dificuldade de caracterizar o crime no caso concreto, salienta-se que essa problemática se refere, preponderantemente, ao primeiro núcleo do tipo, o de “solicitar”. Isso ocorre porque no caso em que o servidor chega a receber a quantia, ainda que seja possível ele esconder tal montante e dificultar assim a ação da polícia, existe pelo menos um objeto material que pode vir, posteriormente, a ser identificado e utilizado como prova na ação penal, caso que não ocorre na hipótese do crime que se consuma já na solicitação.

Porém, a corrupção trata-se de um crime formal e já existe pelo simples ato de o agente solicitar a vantagem em razão da sua função. Assim, mesmo que o autor não chegue a receber o dinheiro ou o benefício, o crime já fora consumado e, portanto, já é digno de punição. O recebimento da “gratificação”, nesse caso, é o mero exaurimento do delito.

A problemática levantada nesse texto é justamente quanto à viabilidade da identificação da ocorrência desse crime, quando se trata da corrupção que se encerrou nessa fase da solicitação. É demasiadamente complicado comprovar que tal agente público solicitou certa quantia, devido à falta de evidencias práticas e reais que possam ser levadas em consideração para a acusação e, posteriormente, para a condenação. Dessa forma, em decorrência dessa dificuldade em coletar indícios nesse sentido, as ações penais, muitas vezes, deixam de ser instauradas e esses ilícitos permanecem impunes, tornando-se um hábito costumeiro no dia a dia dos cidadãos brasileiros.

Direito Diário
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