O Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou punição aplicada a um presidiário pelas autoridades de uma penitenciária do interior de São Paulo. O motivo da punição seria um fato inusitado: o homem abrigava três pombos em sua cela.
A celeuma começou no dia 9 de dezembro de 2012, quando agentes penitenciários apreenderam três pombos que se encontravam debaixo da cama do detento. Foi então que instauraram procedimento administrativo disciplinar (PAD) contra o preso, em que se considerou que este cometera falta grave com base no art. 50, VI, da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984, mais conhecida como LEP). Tal dispositivo afirma que comete falta grave o condenado a pena privativa de liberdade que desobedece ou desrespeita qualquer ordem ou tarefa ordenada por servidor competente.
As autoridades teriam ordenado ao presidiário que entregasse os pombos por temerem que fossem usados como pombos-correio para transporte de objetos ilícitos. Ao serem supostamente desobedecidas, as autoridades instauraram o PAD que culminou com o reconhecimento de falta disciplinar de natureza grave e, por esse motivo, foi decretada a perda de 1/3 dos dias remidos, bem como reiniciada a contagem de prazo para fins de progressão de regime. O Juízo da Vara de Execuções Criminais de Sorocaba, interior de São Paulo, acabou por reconhecer essa punição.
A defesa interpusera agravo em execução penal tentando reverter a situação. Porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a punição, afirmando que, além de as aves serem capazes de transmitir doenças graves aos detentos, “pombas podem, em tese, ser usadas para outros fins, de sorte que a mera posse de tais aves no ambiente carcerário, seja a que título for, representa comportamento claro de desobediência à ordem e disciplina que regem um estabelecimento prisional”.
Foi então que a Defensoria Pública do estado de São Paulo impetrara habeas corpus alegando que o presidiário estaria sofrendo constrangimento ilegal, pois a conduta de portar aves em estabelecimento prisional seria totalmente atípica. Além disso, o apenado, segundo a impetrante, não portava qualquer objeto ilícito. A possibilidade de utilização dos pombos para fins ilegais seria mera suposição das autoridades, além de que esta não teria prolatado qualquer ordem direta e específica para que o apenado retirasse as aves.
A Sexta Turma do STJ, uma das duas turmas que lida com causas criminais da referida corte, ao julgar o habeas corpus, não deu a ele conhecimento, por estar sendo utilizado como sucedâneo recursal. Porém, concedera ex officio a ordem, anulando a falta grave imposta e tudo o mais dela decorrente.
O relator do habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz, afirmara, em seu voto, que, não obstante haver casos em que pombos realmente são usados para transporte ilícito de objetos para dentro de estabelecimento prisional, no presente caso, não houve qualquer comprovação de que réu estaria usando as aves para essa finalidade, mesmo este tendo assumido que um dos pombos realmente o pertencia.
O ministro complementa afirmando que as faltas graves estão taxativamente previstas no art. 50 da LEP, não admitindo, consoante jurisprudência do próprio STJ, interpretação extensiva para acrescentar condutas lá não previstas.
Por fim, afirmara Schietti que não houve sequer violação ao art. 50, VI, da LEP, pois não houve qualquer comprovação de que o preso efetivamente desobedecera alguma ordem direta destinada a ele por alguma autoridade administrativa competente, além de que não teria desrespeitado algum servidor ou qualquer outra pessoa, ou até mesmo deixado de executar alguma tarefa a ele imposta. Portanto, o caso relatado não se configuraria como falta grave, mas sem prejuízo de alguma falta disciplinar leve ou média que poderia se configurar.
Como afirmou o próprio ministro em seu voto, o uso de pombos-correio por presidiários parece ser uma prática cada vez mais comum. Um caso bastante recente ocorreu no dia 4 de agosto, em que um pombo fora encontrado em uma penitenciária da Zona Sul de São Paulo com um colete especialmente costurado para ele, em que carregava, nas costas, um celular. Segundo as autoridades da penitenciária, o animal direcionava-se a uma cela, mas caíra de cansaço por não ser acostumado a carregar um aparelho celular.
Referências http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/Sexta-Turma-afasta-puni%C3%A7%C3%A3o-de-preso-que-mantinha-pombos-embaixo-da-cama