Caso me solicitassem duas instituições que, inevitavelmente, um ser humano terá de visitar se nasceu dentro de uma cidade brasileira, eu diria: um cartório e um cemitério.
Como o último está além do nosso controle saber quando iremos conhecer e seu propósito é auto evidente, somente nos restou entender qual a serventia de um cartório.
Entretanto, além do conhecimento básico que muitos possuem acerca do propósito de um tabelionato (como registrar imóveis, casar pessoas, reconhecer o nascimento e atestar o óbito das mesmas) seus serviços são bem mais diversos.
Aqui, iremos tratar somente do “protesto de título”.
E para isso, nada melhor do que definir ambos os termos para possuirmos uma visão completa.
Os dizeres do cartório Ayres, pertencente ao município de São Vicente, acerca do “protesto”, são bem elucidativos do termo:
“O protesto é um ato formal que se destina a comprovar a inadimplência de uma determinada pessoa, física ou jurídica, quando esta for devedora de um título de crédito ou de um outro documento de dívida sujeito ao protesto. Somente o Tabelião e seus prepostos designados podem lavrar o protesto.
O protesto, basicamente, se destina a duas finalidades: a primeira é de provar publicamente o atraso do devedor; a segunda função do protesto é resguardar o direito de crédito.”
E eles continuam, versando sobre os efeitos de um “protesto”:
“Na esfera judicial, o credor terá em seu poder a prova formal, revestida de veracidade e fé pública, de que o devedor está inadimplente ou descumpriu sua obrigação. Com essa prova, poderá requerer em juízo as medidas liminares, como busca e apreensão, arrestos, etc., terá mais chance de ser o vencedor das ações que promover, cuja discussão seja o título, etc.
Já no âmbito extrajudicial, o protesto interessará a quem realiza empréstimos ou financiamentos, pois estas pessoas (físicas ou jurídicas) desejam saber a real capacidade da outra parte, no que tange ao cumprimento de suas obrigações. Assim, os interessados em geral, sobretudo os órgãos de proteção ao crédito (Associação Comercial, Serasa, etc.) solicitam dos tabelionatos de protesto as relações de pessoas que possuem protestos, lançando-os em seus bancos de dados. Com isso, tem-se maior segurança jurídica, pois, em um exemplo prático, uma empresa financeira só irá realizar um empréstimo se o contratante estiver com seu “nome limpo na praça”.
Mas, o que são os tais “títulos de crédito”?
Para isso, recorremos ao resumo que a estudante de Direito, Caroline Dias, fez sobre o assunto:
“É um documento, portanto não pode ser uma declaração oral, necessário para o exercício do direito nele mencionado. É indispensável o documento para que os direitos nele mencionados sejam exercidos. Daí ser ele um título de apresentação, porque no momento em que desejar exercer os direitos mencionados no título, deve o atual possuidor (chamado de portador ou detentor) apresentar o documento ao devedor ou a pessoa indicada para pagar. Por isso é indispensável. Os direitos mencionados no título são sempre direitos de crédito.”
Ademais, a mesma ainda nos traz as características de um título dessa natureza, algo fundamental para saber o que se pode ou não levar para protesto em um cartório:
“1. Literalidade: só vale nos títulos o que neles está escrito, logo, o que nele não está escrito não pode ser alegado. → Ex: declaro, com minha assinatura no documento, que pagarei o título se o obrigado principal não o pagar; no futuro, não poderei escusar-me de fazer esse pagamento. Por outro lado, se prometo ao portador desse título pagá-lo se o obrigado principal não pagar, mas minha assinatura não constar no documento, não poderei depois ser forçado judicialmente a efetuar o pagamento, pois minha declaração não consta no documento.
2. Autonomia: cada pessoa que se obriga no título está assumindo uma obrigação autônoma, ou seja, não depende das obrigações já assumidas por outros no mesmo título nem a elas vinculada. Cada obrigação é autônoma e o obrigado (aceitante) tem que cumpri-la, em favor do portador, sem poder fugir a esse dever alegando algo sobre as relações com os obrigados anteriores do título. Assim, a autonomia das obrigações assumidas dá ao portador a segurança do cumprimento dessas obrigações por qualquer uma das pessoas que tenham assinado no documento.
(omissis).
3. Abstração: são direitos que não dependem do negócio que deu lugar ao nascimento do título. Uma vez emitido o título, este se liberta de sua causa e, assim, a mesma não poderá ser alegada futuramente para invalidar as obrigações decorrentes do título, pois esse, uma vez emitido, passa a conter direitos abstratos, não cabendo a exigência de contraprestação para poder ser satisfeita a obrigação. Por isso, as obrigações decorrentes do título, por serem abstratas, terão que ser cumpridas não se admitindo qualquer recusa baseada na causa que originou o título.
E então, juntos com a abstração, serão aplicados os princípios da autonomia e da literalidade, isto é, os princípios de que as obrigações são independentes entre si e que, no título, vale tudo e somente o que nele está escrito.”
Resumindo: é uma forma civilizada de cobrar as dívidas, sem precisar recorrer ao Judiciário assim que a mesma se estabelece.
Interessante? Talvez um pouco monótono. Porém, faremos outras matérias acerca das utilidades e serviços prestados pelos cartórios, que se fossem bem conhecidos pelos brasileiros, evitariam tantas preocupações que, acredito eu, até adiaria um pouco mais aquela “outra” visita.