Para onde vamos? A persistência da crise

O ano de 2015 nos mostrou cenas marcantes de eclosão da crise de deslocamentos forçados enfrentados pelos refugiados. As várias imagens de dezenas de pessoas sendo transportadas em embarcações precárias na travessia do mar da Grécia, como também, a foto do corpo do menino sírio encontrado numa praia da Turquia chocaram o mundo no ano que se passou.

Acontece que  os fatos que estes retratos constatam são apenas o ápice de um processo que já se revela continuado. Os efeitos e as dificuldades trazidas por este fenômeno estão apenas em seu prelúdio. É o que sinaliza os números recém informados pelo Alto Comissariado da Nações Unidas para Refugiados (ACNUR).

Segundo estimativas do ACNUR e da Organização Internacional para as Migrações, OIM, fugindo da perseguição, dos conflitos armados, da pobreza, mais de um milhão de pessoas, somente em 2015, atravessaram as fronteiras de suas Nações de origem e buscaram refúgio na Europa.

O número de refugiados em todo o mundo é um dos maiores já vistos desde a Segunda Guerra Mundial, as estimativas indicam que mais de 60 milhões de pessoas estão em situação de refúgio hoje no mundo, isso evidencia o atual estado de alerta e preocupação.

Enquanto se verifica a potencialidade  que há de aumento no número das movimentações daqueles que fogem das situações de instabilidade e insegurança, resta evidente o despreparo dos Estados em receber e suportar a atual demanda, ou no sentido da própria estabilidade Nacional  ou mesmo da efetivação de políticas públicas em acolhimento aos migrantes.

Fato é  que o  Refúgio constitui-se em um instrumento (instituto) do Direito Internacional e o seu reconhecimento por parte de um Estado com a consequente concessão do status de refugiado a um indivíduo implica na vinculação do mesmo aos diplomas legais que objetivamente regulam a questão.

É o que preleciona Liliana Jubilut (2007, p. 74),

Desse modo, tem-se que o refúgio é um instituto regulado por um estatuto (atualmente em nível internacional a Convenção 51 revisada pelo Protocolo de 67), o qual assegura a algumas pessoas em função de determinadas circunstancias o status de refugiado.

O expediente tem como importante escopo a proteção humanitária e a garantia de condições mínimas de sobrevivência e dignidade que são inviabilizadas em face das circunstâncias de perseguição e conflitos em seu país de origem.

Apesar de as atenções voltarem-se, quando se fala em “crise de imigrações”, mais especificamente para o continente europeu, é bem verdade que outros países como a Turquia, o Líbano, a Jordânia, o Paquistão já ultrapassaram a tempos o seu limite de suportar a leva migratória que se constituiu principalmente com a eclosão dos conflitos armados no Oriente Médio.

Note-se que essa conjuntura de crise iniciou-se bem antes de chegar à Europa, sendo forçoso perceber que o atual estágio é, ao mesmo tempo que consequência, também causa para outros problemas.

Uma das facetas do problema trazido a lume anteriormente seria a questão da própria  segurança nacional. Os atentados a Paris em novembro de 2015  levantaram a suspeita de que possíveis terroristas houvessem utilizado da situação de  refugiados para entrar na Europa pela Grécia.  Tal fato ensejou, ou pelo menos propiciou, o retorno à tônica dos discursos defensores do fechamento das fronteiras.

Isso traz preocupação, pois dificulta ainda mais a situação e a efetivação dos direitos dos refugiados. Essa imensa massa de deslocamentos estar a indicar, dentre tantas coisas, a impossibilidade de manutenção de vida digna em alguns Estados. Nenhum indivíduo abandonaria seu lar para embarcar um uma situação de insegurança e incertezas se não fosse esta a sua única alternativa.

Portanto, seja qual for o caminho que se pretenda para os novos rumos dos refugiados e/ou das ações efetivas dos Estados, não se pode de forma alguma fomentar a politização do instituto dando margem para que se desenvolva uma postura xenófoba em relação aqueles que estão em situação de fragilidade.

O instituto do refúgio é instrumento importante para a garantia dos Direitos Humanos e  para a manutenção de parâmetros mínimos de dignidade.  Devem-se buscar meios de flexibilização da mobilidade humana em face de situações extremas como esta. Uma postura de integração e de desenvolvimento de políticas públicas que absorvam à comunidade nacional o potencial dos indivíduos em situação de refúgio poderá ser uma saída ao desafio humanitário.

REFERÊNCIAS
http://www.acnur.org/t3/portugues/noticias/noticia/um-milhao-de-refugiados-e-migrantes-fugiram-para-a-europa-em-2015/>.  Acesso em: 26 de dez.  2015.
JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito Internacional dos refugiados e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro / Liliana Lyra Jubilut. – São Paulo: Método, 2007. 240.: Apêndice
Créditos da imagem: Massimo Sestini fez esta foto a bordo de um helicóptero da Marinha italiana, em 2014. A imagem, feita em um ponto do Mediterrâneo entre a Líbia e a Itália, era praticamente uma repetição da foto feita no ano anterior, ou seja, mostrava que nada tinha mudado. Mas também era mais impressionante. "De um ângulo perpendicular, consegui a visão de 500 pessoas amontoadas num bote, onde passaram cinco dias e cinco noites, olhando para cima e pedindo ajuda ", disse ele. A foto foi vencedora do World Press Photo Award de 2015. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150904_10_imagens_imigracao>.

 

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