Connect with us

Penal

Os Reflexos Probatórios na Delação Premiada

Redação Direito Diário

Publicado

em


Atualizado pela última vez em

 por Bianca Collaço

Por Flávio Rodrigues.

 

RESUMO

O alvo da pesquisa diz respeito à delação premiada e seus reflexos no âmbito processual, com ênfase no eixo probatório, considerando a lei nº 12.850/2013. Neste intento, a questão problema que orienta a pesquisa é a seguinte: Quais as diretrizes probatórias enfrentadas e a repercussão dos pactos firmados na delação premiada frente ao processo penal? O objetivo, especificamente, é constatar como a lei 12.850/2013 pode trazer uma consciência válida e eficaz para o novo cenário investigativo. O trabalho tem como finalidade elucidar alguns pontos sob os métodos utilizados nas investigações e seus desdobramentos. A lei nº 12.850/2013, não exauriu todas as incógnitas, o que faz com que boa parte dos elementos trazidos em seu corpo sejam aperfeiçoados com o passar do tempo, especificamente na prática forense, se encaixando aos métodos e requisitos em total harmonia com o ordenamento jurídico. No entanto, há esperança de que a lei produza seus efeitos normalmente, numa via de mão dupla, onde existe o benefício para a sociedade em face do crime organizado, bem como sejam observados a essência e bases do nosso ordenamento jurídico como um todo, evitando eventuais retrocessos judiciais e sociais.

PALAVRAS-CHAVE: organizações criminosas; delação; valor probatório; requisitos; investigação.

ABSTRACT

El tema del presente trabajo se refiere a la delación premiada y sus reflejos en el ámbito procesal y probatorio, considerando la ley nº 12.850 / 2013. En este intento, la cuestión problema que orienta la investigación es la siguiente: ¿Cuáles son las directrices probatorias enfrentadas y la repercusión de los pactos firmados en la delación premiada frente al proceso penal? El objetivo, específicamente, es constatar cómo la ley 12.850 / 2013 puede traer una conciencia válida y eficaz para el nuevo escenario investigativo. El trabajo tiene como finalidad elucidar algunos puntos bajo los métodos utilizados en las investigaciones y sus desdoblamientos. La ley nº 12.850 / 2013, no exaurió todas las incógnitas, lo que hace que buena parte de los elementos traídos en su cuerpo sean perfeccionados con el paso del tiempo, específicamente en la práctica forense, encajando a los métodos y requisitos en total armonía con el mismo ordenamiento jurídico. Sin embargo, hay esperanza de que la ley produzca sus efectos normalmente, en una vía de doble vía, donde existe el beneficio para la sociedad frente al crimen organizado, así como se observan la esencia y bases de nuestro ordenamiento jurídico como un todo, evitando posibles retrocesos judiciales y sociales.

 KEYWORDS: las organizaciones criminales; los denunciantes; valor probatorio; requisitos; investigación.

 SUMÁRIO

  1. INTRODUÇÃO; 2. O MODELO DE JUSTIÇA CRIMINAL NEGOCIADA CONFORME O SISTEMA NORTE-AMERICANO; 3. EVOLUÇÃO DO INSTITUO ATÉ A PROMULGAÇÃO DA LEI 12.850/13; 4. A PROBLEMÁTICA DA LEI 12.850/13 NO ÂMBITO DA COLABORAÇÃO PREMIADA; 4.1. O PACTO FIRMADO E A CREDIBILIDADE DO DELATOR; 4.2. A BARGANHA NO ACORDO E A CONSEQUÊNCIA PARA O CONTEÚDO PROBATÓRIO; 5. COMPREENSÃO DOS ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS; 6. CONCLUSÃO DO ALCANCE PROBATÓRIO DECORRENTE DO ACORDO; REFERÊNCIAS.

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho contempla o tema, O alcance probatório da delação premiada: uma abordagem precisa com relação a produção e a utilização das possíveis provas obtidas através do pacto firmado. De forma delimitada, abordam-se os aspectos gerais e principalmente jurídicos que tratam o assunto, se envolvendo especialmente pela apaixonante matéria das provas no processo penal.

A relevância do tema foca no nascedouro da Lei 12.850/2013 que trata das Organizações Criminosas, na qual trouxe evidente impacto na seara criminal, isso porque, a mencionada Lei fixou regras antigamente inexistentes, o que fez com que sua amplitude de aplicabilidade fosse maior em relação a boa parte das outras leis que possuíam algumas ligações com o crime organizado.

A delimitação do tema se deu pela atualidade, onde boa parte das operações deflagradas, que tem como uma das funções primordiais o rompimento de supostas organizações criminosas, estão amparadas pelo advento da Lei em análise.

Dessa forma, o estudo trabalha com hipóteses de que tal relevância é fruto do marco valorativo alcançado pela sociedade como um todo, vez que é notório os efeitos surtidos ao longo do tempo, a partir da sua entrada em vigor, fazendo com que crimes antes desconhecidos, ou pouco investigado em decorrência da dificuldade para desmembrar a estrutura criminosa, atualmente já encontra amparos mais práticos e objetivos, capazes de solucionar incontáveis investigações.

Diante da importância do instrumento, o objetivo geral do trabalho é analisar a abordagem crítica do tema aqui relacionado, qual seja a envolvência da colaboração premiada em diversos fatores, especialmente sob o ângulo jurídico, sendo que o mais importante para o momento é observar a Lei na sua dimensão atual e futura, presando objetivamente pelos apontamentos quanto ao conteúdo probatório em face dos seus alcances, limites, métodos e requisitos para tanto.

Com o procedimento metodológico, utilizou-se pesquisa bibliográfica, artigos de internet e Lei Federal, com a finalidade de proporcionar melhores e mais precisas informações sobre o tema, buscando aumentar ainda mais o conhecimento e mergulhando na riqueza que o assunto tende a nos oferecer.

O texto está dividido em seis partes, além desta introdução. O capítulo dois descreve sobre a comparação do modelo de justiça criminal negocial em face do norte-americano; o terceiro capítulo demonstra a evolução do instituo em território brasileiro; o quarto capítulo nos fala da problemática contida no acordo perante a lei 12.850/13; no quinto analisaremos a compreensão dos aspectos constitucionais e infraconstitucionais; e por fim, o capítulo seis conclui nos fazendo refletir o alcance probatório decorrente do acordo firmado.

2 MODELO DE JUSTIÇA CRIMINAL NEGOCIADA CONFORME O SISTEMA JURÍDICO ADOTADO NA AMÉRICA DO NORTE

 A justiça utilizada como balcão de negócios não é novidade apenas em território brasileiro, já que há muito tempo já vem sendo instrumento utilizado na maioria das demandas envolvendo os processos norte-americanos.

O sistema lá utilizado, conhecido como Plea Bargaining, é tratado pela Regra de Procedimento Criminal Federal n. 11 – Federal Rules of Criminal Procedure, Rule 11 – Pleas.

Em um primeiro momento, é importante a comparação face ao sistema norte-americano, isso porque tal sistema jurídico difere em grande maioria com o que se vê em solo brasileiro, haja vista, que lá predomina o sistema do Common Law, ou seja, o que prevalece naquele continente é os costumes, de um direito misto e principalmente jurisprudencial e não um direito positivado.

Sobre o tema, é coerente o magistério do saudoso professor Vicente Raó (1999, p. 131):

A common law corresponde a um sistema de princípios e dos costumes observados desde tempos imemoriais e aceitos, tacitamente, ou expressamente, pelo poder legislativo, revestindo ora caráter especial, quando imperam em certas regiões, tão-somente.

Como se nota, o direito norte americano tem como fonte o sistema anglo-americano, onde vigora alguns pontos distintos do que decorre o sistema brasileiro.

Aqui, a jurisprudência cumpre um papel por meio dos Tribunais no sentido de interpretação das normas positivadas. Difere, portanto, daquele lá existente, já que no sistema anglo-americano, o papel da jurisprudência tem como marco essencial o entendimento da lei conforme os precedentes feitos em longo prazo no percorrer da história daquele ambiente.

Ainda sobre a distinção do tema, nos ensina o saudoso professor Miguel Reale (2002, p. 142), afirmando que:

 

A tradição latina ou continental (civil law) acentuou-se especialmente após a Revolução Francesa, quando a lei passou a ser considerada a única expressão autêntica da Nação, da vontade geral, tal como verificamos na obra de Jean-Jacques Rousseau, Du Contrat Social.

 

Pois bem: é necessária a compreensão da produção das normas jurídicas, não apenas para conhecer as peculiaridades de cada ordenamento, mas para enxergar com mais precisão, o sentido necessário no que diz respeito ao tema aqui apresentado, assim como buscar o aperfeiçoamento jurisdicional, aprendendo com erros e acertos de locais distintos.

O que se sabe, é que em grande maioria dos casos, a função do Estado norte-americano são realizados em função de acordos, no sentido de não dar seguimento em processos judiciais, fazendo com que aquele que está diante da acusação possa decidir quanto as propostas feitas pela parte contrária. Esse é o chamado plea bargaining.

Por tais razões, em larga proporção, o acusado aceita as propostas do acordo, se declarando culpado (ainda que não seja) por ter a convicção de que os pontos oferecidos são mais vantajosos, em face da não possibilidade de ir a julgamento perante o Júri daquele Tribunal ou do próprio Juiz daquela Corte, podendo inclusive obter uma pena ainda maior do que aquela proposta inicialmente.

O tema se assemelha minimamente ao que prevê o ordenamento jurídico brasileiro, já que para a realização do acordo, é imprescindível que resulte da vontade livre e consciente do acusado, somado ao fato de que deve se declarar culpado.

Vale destacar, que o plea bargaining naquele continente, diferente do que se exige nosso ordenamento jurídico positivado, pode ser utilizado em decorrência de qualquer crime, não interessando se é de alta periculosidade ou não, pouco importando os antecedentes do acusado.

Nota-se, portanto, a realização intrigante no sentido de que toda economia processual é bem vinda no sistema adotado e seguido pelo país norte-americano, dada as negociações constantemente lá realizadas entre acusação e defesa, fazendo com que sejam raros os processos que cheguem a ser julgados pela Corte ou pelo Júri.

Tal comparação começa a ganhar relevo, descortinando algumas delimitações no tocante as distinções existentes entre um sistema e outro. Ao que se percebe, o ordenamento jurídico norte-americano de longa data já trabalha com opções de métodos caracterizadores relacionados aos acordos ainda na fase extrajudicial, quase não existindo maior dilação do processo.

Demonstra, portanto, a liberdade em que acusação tem para a formação da culpa, bem como em solucionar as demandas relacionadas aos contextos criminais. É certo, que o que há é uma política criminal muito ampla, inexistindo talvez um controle efetivo da jurisdição quanto aos pactos firmados.

Cumpre destacar, que naquele território, ainda com um número excessivo de acordos realizados, muitos dos acusados ainda cumprem pena, obviamente a depender do caso em questão, coincidindo também com o maior número de encarcerados em todo o mundo.

A rotineira e excessiva liberdade nos acordos realizados sem maiores controles se fosse realizado em território brasileiro, demonstraria uma falta de sintonia com o devido processo legal, onde mais vale o acordo apresentado no calor das emoções, admitindo muitas vezes uma culpa inexistente, a enfrentar um processo, caracterizando, ao fim das contas, êxito por parte da acusação na solução das demandas, demonstrando que nem sempre quantidade é tido como qualidade na prestação da justiça.

Vê-se, portanto, que a análise avaliativa quanto ao sistema divergente realizado no país norte-americano, ainda que diverso em alguns pontos, consegue ser dinâmico e alertar ao nosso sistema negocial jovem quanto as inúmeras problemáticas existentes, desde o âmbito do pacto firmado, do elevado índice de prisões e principalmente o manejo e utilização do acordo como valor de prova no âmago da ação penal.

 

3 EVOLUÇÃO DO INSTITUTO ATÉ A PROMULGAÇÃO DA LEI 12.850/2013

 

De início, tem-se que a historiografia clássica sobre o tema aqui examinado é de uma concepção voltada ao que já se aproxima com o processo judicial, dada a síntese dos fatos envolventes.

Diante da notoriedade e importância que o tema nos impulsiona nos dias atuais, é preciso, antes de adentrar no cerne da questão, voltar os olhos para épocas remotas, onde o instituto já demonstrava a sua importância, em casos complexos e marcantes em decisões no trânsito da história brasileira.

Descortinando aquilo que muitos costumam imaginar, o instituo da delação premiada não teve seu nascedouro por meio da operação Lava-Jato. De longa data, vez ou outra, utilizando de formas e meios diferentes já vinha sendo objeto de investigação-punição.

Tal como se nota, ou seja, observando o que predomina o nosso sistema de justiça, vigente conforme o Civil Law, a Lei em exame é extremamente recente no ordenamento jurídico, no que diz respeito ao objetivo de padronizar a nova dinâmica das operações envolvendo grandes montas, mas que já há bastante tempo já está contido no intimo da natureza social humana.

Em épocas remotas, ainda quando o Brasil se utilizava das Ordenações Filipinas, o instituto – de longe nem conhecido como colaboração premiada – já era método utilizado para determinar algumas finalidades relacionadas a alguns crimes. Naquela ocasião, um dos crimes marcantes na história brasileira, o espírito do instituto já se fazia presente, quando no desfecho do crime de Lesa-Majestade, aquele conhecido como “Traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado”.

A história nos ensina que já em meados do ano de 1789 houve a primeira notícia em solo brasileiro do uso do instrumento. A trama tem início com Joaquim Silvério do Reys, que em 15 de março de 1789 em busca de benefícios, viaja ao Rio de Janeiro e denuncia a conjuração de Minas ao visconde de Barbacena e termina com a delação firmada por este em face dos inconfidentes mineiros.

Após o início das primeiras informações delatadas, Silvério dos Reys passou a estreitar ainda mais os laços com os inconfidentes mineiros, com a finalidade de obter mais informações para ser usado em seu favor tão logo que fosse solicitado pelo Vice-Rei, ao passo que duas outras cartas de delações também foram realizadas, sendo a segunda feita por Basílio de Brito Maleiros do Lago, em 19 de abril de 1789 e a terceira e ultima realizada por Inácio Correia Pamplona em 05 de maio de 1789.

Já naquela época, a teoria dos jogos já se aplicava conforme o interesse de cada homem, de modo que não haveria tais informações se em contrapartida não existissem benefícios aos delatores, que, diga-se de passagem, o delator saiu de dentro da própria inconfidência para trair os demais.

Segundo José (1985, p. 140):

 

O motivo maior, contudo, estava na esperança de ter, como recompensa da delação, o perdão da elevada dívida que o jungia ao Tesouro. Bastou que o intimasse, no dia 3 de março de 1789, para apresentar sua prestação de contas pelas quantias recebidas como direito de entradas para que arquitetasse, como solução salvadora, o ir a cachoeira do campo e delatar tudo ao Visconde.

 

As conseqüências das cartas de delações realizadas foram as prisões dos inconfidentes mineiros, especialmente em desfavor daquele que tanto queriam, qual seja Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, sendo realizada a sua prisão no dia 10 de maio de 1789 e a sua execução e esquartejamento em 21 de abril de 1792, demonstrando ter combatido o bom combate em prol da liberdade.

Como se nota da história, a ideologia do pacto guarda uma intimidade conectada ao âmago de cada ser humano, diante dos quesitos éticos, morais e materiais conforme o interesse de cada delator perante o prêmio oferecido.

Diante do acervo histórico, é a conclusão que se faz os professores Aquino, Bello e Domingues (1988, p. 119):

 

Saber de suas idéias, de seus atos, de suas determinações, de suas prisões e penas não é algo que se encerra no passado, mas que está presente ainda hoje em várias lutas, em várias frentes, em vários movimentos nos quais a tônica ainda é a mesma que motivou os habitantes de Minas Gerais em 1789: LIBERDADE.

 

Como se nota, o tempo pode passar, mas a história pode e deve ser comparada, para melhor se aperfeiçoar, fazendo uma conexão no que diz respeito aos pontos necessários e valiosos, nos acertos e nos erros, de modo que a problemática seja sempre observada para que erros não venham a ser repetidos.

Na atualidade, em tempos não tão distantes assim, já superadas inúmeras etapas da história brasileira, algumas leis arriscaram dizer sobre o tema, mas não obtiveram êxitos práticos, tais como; Lei dos crimes hediondos (Lei n. 8.072/90, art. 8º, parágrafo único), passando após a integrar as leis de crimes contra o sistema financeiro (art. 25, §2º, da Lei n. 7.492/86), crimes contra o sistema tributário (art. 16, parágrafo único, da Lei n. 8.137/90), crimes praticados por organização criminosa (art. 6º da Lei n. 9.034/95), crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º, §5º, da Lei n. 9.613/98), a Lei de proteção a vítima e testemunhas (art. 13 da Lei n. 9.807/99) e por fim a Lei n. 12.850/13 na qual será objeto de exame didático neste trabalho.

Como se nota, o tema negocial aqui tratado, já vem sendo utilizado há bastante tempo, seja em âmbito histórico-nacional ou em dimensões internacionais.

O sistema acordos atribuído ao sistema jurídico, vem se espelhando nos contextos enfrentados pela própria sociedade como um todo, visto que, com o avanço da globalização e o capitalismo, a maioria dos cidadãos age conforme seus próprios interesses, movidos por um sentimento de negociação a todo e qualquer custo.

Assim sendo, no que tange ao diploma processual penal, não foi diferente. Isso porque, como dito a pouco, a sociedade evoluiu em uma rapidez talvez inesperada, e com isso o avanço e as modificações quanto as condutas relacionadas aos crimes praticados também não foram diferentes, necessitando de uma resposta concisa do legislador para o enfrentamento dos problemas sociais como um todo.

Sobre o assunto, Pinto (2012, p. 158):

 

A condição de Estado Democrático de Direito deflagra decorrências diretas e incisivas para o exercício do poder jurisdicional, primordialmente na esfera criminal, estabelecendo, os signos através dos quais se estabelecerá a linguagem para a construção da verdade no processo, signos esses que preconizam a participação equânime das partes em contraditório na construção do provimento e o reconhecimento de limites bem definidos para a intervenção no direito das pessoas.

 

É por tais razões, que o avanço do direito e seus institutos é necessário, mas tudo dentro do que predomina as garantias constitucionais, haja vista que a punição de todo e qualquer crime é essencial para a sociedade, devendo, contudo, observar sempre as garantias e as regras do jogo necessárias para tanto.

Percorrido todo o trajeto histórico do instituto até os dias atuais, assim como realizado uma análise comparada entre os ordenamentos jurídicos que utilizam da justiça negocial, permite uma facilidade na compreensão dos pontos a serem enfrentados posteriormente, carregados pelas peculiaridades de cada tópico.

 

4 A PROBLEMÁTICA DA LEI 12.850/2013 NO ÂMBITO DA COLABORAÇÃO PREMIADA

 

Tal lei delimitou métodos, requisitos e meios necessários que pudessem alcançar a criminalidade mais sofisticada. Vale destacar, que a lei em análise, efetivamente conduziu a um avanço potencial para a sociedade como um todo, isso porque, com pouco tempo de existência, conseguiu viabilizar e desestruturar pirâmides sofisticadas e criminosas, alcançando todas as pessoas, sem qualquer exceção de cargo ou função no meio social.

Cabe destacar, que apesar do advento magistral da presente lei, vieram também alguns pontos negativos que devem ser observados em sua peculiaridade, no âmbito constitucional e processual. Tais elementos são facilmente percebidos quando colocados em xeque com os demais dispositivos do ordenamento jurídico, quando não são feitos da melhor maneira possível.

Não obstante, em que pese esse ponto valorativo, faz necessário mergulhar nas diretrizes da legislação para uma analise concreta e mais coerente do ponto de vista técnico-jurídico e principalmente crítico no que diz respeito ao tema em apreço.

Esse paralelo é importante ser traçado, pois do contrário do que trazia outras leis, aqui, o legislador não se limitou em aspectos rasos sem meios possíveis de serem alçados, muito pelo contrário, definiu organização criminosa e dispôs sobre investigação criminal, os meios de obtenção de prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal.

Não obstante, o que tem visto é a utilização de um instrumento de enorme valor conquistado pela sociedade brasileira, mas que vem sofrendo um mau uso diante dos casos em concretos, banalizando um instrumento, que aos poucos, com o desvalor no uso, passa a não mais observar as garantias e as legalidades exigidas, de modo que analogicamente como ocorre com os contratos na seara cível, aqui também devem ser desfeitos ou não aproveitados quando não realizados conforme a melhor exigência normativa visto como um todo.

Por essa análise, percebe-se que o legislador enriqueceu o âmbito da produção das provas e com isso houve a criação de uma seção específica apenas para a colaboração premiada, mas que como será apontada, em grande maioria, não tem sido o desejo do espírito da lei, mas apenas, do próprio julgador e/ou acusador.

 

4.1 O pacto firmado e a credibilidade do delator

 

Normalmente, a pessoa que delata os demais envolvidos no crime organizado, é pessoa que esteve no bojo da criminalidade, exercendo um papel na estrutura do delito. É, pois, aquele identificado como o traidor, no qual faria qualquer coisa para obtenção de qualquer outra vantagem própria. Do ponto de vista ético, moral e, portanto filosófico, seria mais um ser humano vil. Mas não é esse o foco.

O que acontece é que a atual legislação não ousou fazer apontamentos sérios e precisos quanto a credibilidade daquele que delata.

Pelas razões retro apontadas, merecia uma análise firme quanto ao que o traidor viria a dizer, mesmo porque, se traiu e enganou uma vez os próprios comparsas ou até mesmo amigos, quem dirá o órgão que investiga as condutas criminosas.

É sabido, que todas as informações são confrontadas com as demais provas produzidas no transcorrer da possível ação penal. Entretanto, também é de conhecimento notório que não é bem assim que vem funcionado o instituto.

Pode em um primeiro momento, o delator apontar informações pertinentes ao Ministério Público – cego que pela condenação – sem, contudo, apontar o contexto geral. É o caso, v.g., daquele que aponta alguns criminosos, informa a localidade do dinheiro, mas omite informações quanto ao chefe da organização criminosa ou até mesmo da existência de outras pecúnias, que podem inclusive, ser maior que aquela informada anteriormente, garantindo, quem sabe, a segurança quando a sua saída pós-delação.

Infelizmente, o processo penal brasileiro, de longa data se acostumou com a palavra das testemunhas para configurar decretos condenatórios. Isso ocorre, por conta da ineficiência do Estado em não buscar, ou até mesmo, se limitar com a sua real função de investigar, não exercendo outros aparatos investigatórios disponíveis, se contentando com a pouca informação ali existente, formando, inclusive a própria convicção.

Por muito tempo, o que se viu eram provas testemunhais, apelidadas como rainhas ou princesas do processo penal. Fatídico engano. O ranço testemunhal se estendeu por muito tempo, ao passo que até pouco tempo ainda prevalecia o entendimento de que o depoimento do policial isolado poderia ser apoiado, conforme o livre convencimento do julgador, para fundamentar uma condenação. Fato que vem sendo alterado pelos Tribunais do país.

Quanto ao tema aqui analisado, sabe-se que a delação não tem apenas como método tão somente a obtenção de prova (tema que será analisado em tópico próprio), mas de acabar com a imagem daquele que venha a ser delatado.

Todos os dias, por anos, quando milhares de cidadãos brasileiros acordam, já ficam na emoção e expectativa de se depararem com um acordo de delação premiada, sendo o método realizado como a principal opção de investigação, diante da facilidade de fechar um pacto com a acusação-investigação-órgão jurisdicional detentora do poder.

Ainda no início das investigações, ventilado os nomes daqueles que vieram a ser delatados, uma formação de culpa coletiva já começa a ser embasada, quase que cumprido com um mandado de prisão acompanhado já de uma sentença condenatória.

Destaca-se, que não foi identificado até o momento qual seria o marco inicial de credibilidade em relação ao delator, a não ser a demonstração de razoáveis provas e que sejam capazes de somar ao processo, bem como a identificação de outros integrantes da chamada Organização Criminosa, ou seja, algo sensível e de grande subjetivismo.

Portanto, não se faz coerente, ao ponto de ser ilógico dar total amparo ao delator, bem como lhe proporcionar incontáveis benefícios, em troca de informações. Não é justo que o Órgão que deva fazer cumprir a lei, possa beneficiar um delator, sem qualquer índice como base de credibilidade, em troca de informações.

Nesse diapasão, Conde (2003, p. 83-84):

 

dar valor probatório à declaração do corréu implica abrir a porta para a violação do direito fundamental à presunção de inocência e a práticas que podem converter o processo penal em uma autêntica frente de chantagens, acordos interessados entre alguns acusados, entre a polícia e o Ministério Público, com a consequente retirada das acusações contra uns, para conseguir a condenação de outros.

 

Diante desse saudoso entendimento do jurista argentino, tem-se que talvez este método, sem qualquer resquício de probabilidade da fiabilidade nas declarações feitas pelo delator, torna preocupantes as garantias no processo penal.

Frisa-se, o que existe atualmente é a correlação entre as informações prestadas no pacto firmado perante os resultados obtidos a partir destas, devendo ser observada no transcorrer da ação quando conjugada com outras provas e principalmente quando na prolação da sentença, de modo, que no início, o que há é uma omissão por parte do legislador, que possivelmente não tinha a percepção das conseqüências que viriam a ocorrer.

Se o processo penal não atendesse aos anseios midiáticos, como que um show a cada dia, mas do contrário, buscasse nas minúcias das investigações primeiro, para depois lançar informações, assim como depois de realizado um primeiro juízo condenatório (ou absolutório) quanto ao enredo dos fatos exercidos, seria de melhor empenho para o processo. Assim agindo, não estaria impedindo o conhecimento dos fatos da população, haja vista que a publicidade dos atos seriam realizadas de maneira idêntica, porém, com cautela e segurança.

Evidentemente, seria uma forma mais concisa, afastando o mal midiático que afronta não a violação da imagem daquele que vem a ser investigado, como também o aumento da vaidade existente entre as partes no processo crime, somado a inexistência de qualquer afronto ou interferência na decisão do magistrado.

Sobre o tema, Malatesta (2009, p. 48-49):

 

A certeza legal é um erro lógico que se resolve em erro jurídico, pela condenação que se é obrigado a infligir a quem se tem por inocente e a impunidade que se obriga a conceder ao culpado. E este erro jurídico, por sua vez, converte-se em político, devido à perturbação que origina na consciência social, feota espectadora fatal do inocente e absolvição fatal do culpado. Basta que se repercuta na consciência social o eco de uma só condenação, reconhecida injusta e não obstante infligida ao inocente; bastará que repercuta, na consciência social, o eco de uma só absolvição, reconhecida injusta e, no entanto, conhecida ao réu, para que toda a fé na justiça humana se desvaneça e não reste aos corações, em nome da justiça, senão um sentimento de desconfiança e esgotamento.

 

Sobre o tema, não é demais lembrar a condenação realizada em primeiro grau no âmbito da midiática Operação Lava-Jato, onde a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª região afastou a sentença condenatória, absolvendo João Vaccari Neto dos crimes lá imputados, sob os fundamentos de ter sido uma condenação, frisa-se, baseada exclusivamente no instituto da delação premiada, conforme aponta o conteúdo da Apelação Criminal n. 5012331-04.2015.4.04.7000.

É por tais razões, que o método utilizado na Itália está avançado com relação aos métodos aqui propostos neste ponto em específico. Isso porque, naquele sistema exige um controle sobre a valoração da declaração prestada, devendo ser examinada sobre três fases, como adverte o magistério de Badaró Advogados (2016, p. 2):

 

Em relação a credibilidade do delator, ou seja, a circunstância de que seja pessoa digna de fé (é o tema “de quem fala”); em relação a coerência e verossimilhança da narração (é o tema de “que coisa disse”); em relação aos chamados elementos extrínsecos, isto é, a circunstância de que a declaração do delator, na parte significativa da reconstrução dos fatos, encontre confirmação em outros elementos de prova (fenômeno não diverso da convergência dos indícios sobre uma mesma proposição).

 

Como se nota, o método lá traçado não busca tão somente a distribuição exagerada de acordos em troca de meras informações, mas exige do delator um esforço a mais para contribuir na investigação, bem como um fio de credibilidade, evitando e auxiliando as partes envolvidas para o direcionamento contra as ilegalidades.

Certamente, dada a experiência de tempos remotos enfrentados pela Itália, possibilitaram uma análise mais condizente, propiciando um dos métodos de investigação, sem, contudo, afastar os demais aparatos a disposição do Estado, de modo que impossibilite o Estado de ficar preso aquelas declarações.

Ante a omissão do legislador brasileiro em não estipular parâmetros para os acordos de delação premiada, vê-se que, o espelhamento neste ponto em específico do sistema italiano, evitaria o alto índice de delações, impedindo também uma participação midiática quanto as operações, e principalmente evitaria erros no que tocante a condenações inapropriadas, permitindo que haja no inicio após o pacto firmado, durante a persecução criminal e ao final da ação penal, prevaleça a regra da corroboração, sobretudo a segurança jurídica, nos moldes que se exige nosso sistema e fonte de direito.

 

4.2 A barganha no acordo e a consequência para o conteúdo probatório

 

Vários são os métodos realizados pelos investigadores para se chegar a um acordo. Apesar do mencionado acordo não poder ser realizado sem a defesa técnica presente no momento, sob pena de nulidade do ato, tem-se que ainda assim, o investigado se encontra numa situação complexa e muitas vezes sem saída.

Acredita-se que tal método utilizado lembra os meios realizados em datas pretéritas, antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de 1988, onde métodos de coação física eram utilizadas para obter informações, ao passo que no presente, são os métodos de coação psicológicos muitas vezes feitos para ter acesso as informações.

Há que se levar em consideração os meios utilizados por aqueles que conduzem a investigação, buscando aprofundar ainda mais nas minúcias de cada caso em análise.

Não há dúvida, que em boa parte dos acordos de delação premiada firmados, foram feitos analogicamente sob o ideal da “moeda de troca”. Os acordos são realizados através de pressão psicológica, a fim de garantir uma possível declaração, no intuito de obter provas que cheguem ao maior número de comparsas envolvidos na trama criminosa, bem como na identificação de outros produtos derivados do crime organizado.

A produção de prova, que é dever intimamente delegado ao Estado, não pode ficar aquém a depoimentos tão somente obtidos no balcão da investigação, prezando sempre pela barganha, como meio mais fácil de obter provas, se limitando a este instrumento de investigação.

Portanto, é nessa esfera que nasce a preocupação com relação ao instituto em análise, sob o ponto de vista da banalização da delação premiada e a forma com que é utilizada para concretização na vontade dos investigados em possuir mais detalhes da trama criminosa. Diante desse contexto, persiste a insegurança que pode advir com o passar do tempo e o medo com relação a tais provas obtidas e juntadas no processo, que podem ser cruciais para suceder as injustiças.

Evidentemente que no transcorrer de toda e qualquer investigação traçada nos dias atuais, quando exercida com o instrumento da colaboração, muitos são os métodos para se chegar ao desejo dos condutores do ato.

Atualmente, o processo penal por conta das inúmeras maneiras recentes a disposição, acompanhando a evolução da sociedade, tem impulsionado métodos talvez mais precisos, conforme a disposição legal.

Em que pese os métodos serem legais, existe maneiras diversas que podem ser utilizadas, mas que não acompanham a melhor coerência dos casos.

O cidadão investigado quando na presença de um interlocutor do Estado lhe oferecendo inúmeros benefícios em troca de informações, se vê em uma situação privilegiada. Neste momento, o investigado oferece todas as informações de seu conhecimento, aquela que sabe e também as que imagina que sabe, tudo isso para ratificar o acordo e o prêmio.

Dessa forma, em uma situação onde o investigado só será agraciado com os benefícios oferecidos se ventilar uma enorme gama de informações para a parte contrária, neste momento poderá exceder nas informações ou até mesmo omitir outras a depender do caso em concreto.

Em analogia ao tema, Pacelli (2013, p. 412):

 

O sujeito, portador do conhecimento dos fatos, é o homem, titular de inúmeras potencialidades, mas também de muitas vulnerabilidades, tudo a depender das situações concretas em que estiver e que tiver diante de si. Por isso, a noção de verdade, que vem a ser buscado na prova testemunhal, em regra, poderá não ser unívoca.

 

Naturalmente, todos agem conforme o próprio interesse, uns mais que os outros. Em um ponto específico, por exemplo, o órgão acusatório, em muitas vezes utilizando o enorme poder que tem, acaba rompendo os limites existentes. Isso porque, não pode o órgão, na sua condição, tentar substituir o judiciário, prometendo benefícios que não dependem dele mesmo, uma vez que, apenas ao juiz cabe o crivo para examinar se as funções do colaborador foram atendidas e qual seria o grau do benefício merecido.

É preciso delimitar e sempre que possível reforçar os limites de atuação de cada parte no processo, sendo necessário ter em mente que o judiciário não está atuando como comércio, lembrando que todas as partes podem muito, mas não tudo.

É nesse prisma, que paira sobre o ar a dúvida quanto aos elementos ali produzidos no acordo e qual espaço essa barganha alcança junto as demais provas produzidas por acusação e defesa.

O que se vê pelo processo penal midiático, é que as informações produzidas dessa maneira têm sido quase que verdade absoluta, de modo que todo o cumprimento de mandado de prisão, já se aguarda a realização do acordo, assim como em todo processo que contém a colaboração premiada, o olhar das partes direcionado ao pacto tem um brilho a mais em detrimento de outras, tudo se baseando e concluindo pelo acordo firmado.

É patente o retrocesso. Isso porque, demonstra que o valor de uma prova passa a ser maior que a outra, como vivida no sistema legal de provas, existindo na verdade uma tabela valorativa de cada prova produzida, caminhando junto com o que prevê a barganha no comércio em geral, qual seja a procura e oferta e o valor ou hierarquia de cada informação produzida.

Conforme lição de Lopes Junior (2017, p. 352):

 

Saltam aos olhos os graves inconvenientes de tal sistema, na medida em que não permitia uma valoração da prova por parte do juiz, que se via limitado a aferir segundo os critérios previamente definidos em lei, sem espaço para sua sensibilidade ou eleições de significados a partir da especificidade do caso.

 

Esse sistema de provas já foi deixado em época remota, mas percebe-se que é tem sido bastante utilizado onde tem a presença do acordo de colaboração premiada, sendo por vezes esse o trato que a mídia tem dado ao assunto, e pasme o próprio judiciário tem dado uma valoração maior.

É por tais razões, que o acordo feito dessa maneira, qual seja nos modelos negocial da barganha, é que não merece um grau elevado em detrimento dos demais conteúdos produzidos, devendo, portanto estarem em um mesmo grau de hierarquia, para garantir a busca da verdade real dentro da ação penal.

 

5 COMPREENSÃO DOS ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS

 

Apesar das diretrizes práticas, nota-se que tal método tem sido utilizado como forma primária de investigação, muitas vezes, afastando as diretrizes elencadas na Constituição Federal e nas linhas processuais.

Atos tidos como inquisitórios e arbitrários, ligados a substituição do judiciário pelo Ministério Público, no que diz respeito aos benefícios propostos, tem causado enorme contradição no meio forense.

A compreensão de tais aspectos nasce com algumas inobservâncias dos princípios basilares do ordenamento jurídico, contidos expressamente na Constituição da República de 1988. Tais princípios como o devido processo legal, ampla defesa e o crivo do contraditório, quando não são observados dão espaços para os métodos inquisitórios, passando a ser um fatídico retrocesso.

Como se sabe, a Constituição e o processo penal já não mais adotam o caráter inquisitório, motivo pelo qual, não deve qualquer cidadão, seja culpado ou não, se furtar da ação penal, ao passo que só ela e ao fim dela, quando observados os requisitos da verdade real é que será possível a aplicação de qualquer sanção ou até mesmo uma absolvição, e não da forma como tem sido feito por parte dos órgãos investigatórios, que negociam os privilégios e substituem o judiciário.

Noutra linha, alguns métodos têm sido observados em solo Italiano, quando estão diante de um acordo de colaboração premiada, de modo que naquele continente prevê que aquele magistrado que atua no controle e validação do pacto firmado entre acusação e delator não seja o mesmo que acompanhe o trânsito da ação.

Aqui, em território brasileiro, o tema se encaixaria perfeitamente, haja vista que buscaria se aproximar ainda mais com o que prevê o nosso sistema constitucional e processual penal, impossibilitando assim, que o juiz que atuou na fase pré processual determinando algumas medidas cautelares, bem como na análise da validade do acordo em um primeiro momento, que estes atos não interfiram na imparcialidade do magistrado.

Estamos diante de um importante instrumento vivenciado e conquistado pela sociedade, sendo um método valoroso para as investigações. Contudo, quando não utilizado de forma coerente, há uma transformação em um dispositivo de arbítrio, vingança ou injustiça.

 

6 CONCLUSÃO A RESPEITO DO REFLEXO PROBATÓRIO DECORRENTE DO ACORDO

 

Tem-se que o alcance das provas deva ser analisado sob um aspecto essencial sob diversos pontos, para que seja dada a sua importância no mundo da valoração, sobretudo da correlação.

De toda sorte, é preciso que o julgador tenha a sensibilidade de aprofundar e principalmente analisar todo o teor até então produzido, posto que a simples homologação, por si só, não deva ser predominantemente evidenciada como sendo uma prova propriamente dita. Isso porque, a distinção no mundo jurídico das provas vai além ao aspecto irrisório, sendo necessária uma profunda análise.

Nesta esteira, o professor Malatesta (2009, p. 135):

 

Sempre que se fala em substancia de provas, não se fala da relação da prova com a verdade abstrata ou uma verdade concreta qualquer, cuja verificação não está em vista. Não, fala-se da relação determinada da prova concreta com a verdade concreta que se queira verificar. As provas, portanto, como tais, para se classificarem quanto ao objeto, são consideradas relativamente à verdade concreta que se deseja verificar e a serviço da qual são chamadas a funcionar. É nesta relação das provas com a verdade que se queira verificar, que assenta seu critério objetivo, destinado a classificá-las segundo sua natureza substancial. (sic)

 

Diante da riqueza clássica deste ensinamento, fica claro a relação de importância com que devem ser consideradas o tema probatório, isso porque, dentro de sua limitação, são variáveis os efeitos e suas necessidades encontradas, a depender do caso concreto.

E mais: a questão é de tão importância que merece ir além. As diretrizes da prova se aplicam a sua relação direta e indireta. Aquela diz respeito ao objeto imediato ou consiste em elementos mínimos e fracionários do crime. Já a indireta, consiste no campo da presunção ou dos indícios. Vale destacar que toda prova tem um sujeito e um objeto, que podem ser observados em variáveis formas.

A questão é, toda e qualquer prova necessita de uma avaliação especial, para se chegar a um mínimo de certeza com relação a um fato, precisa, portanto, o julgador avaliar a credibilidade subjetiva da prova. Nesse contexto que, finalmente, após superada inúmeras etapas é que encontraria respaldo nas delações firmadas.

Assim sendo, é nessa linha que o legislador deve residir a fim de que chegue a um convencimento pautado naquilo em que o elemento probante mais se aproxima, ao passo que, a avaliação da prova, neste contexto, deve repousar no mínimo de credibilidade e veracidade, e por ser assim, não há que se falar que a delação premiada é prova, podendo até ser meio de obtenção prova, posto que, não passa de um elemento de fonte de conhecimento, servindo para adquirir um interesse finalístico para compor uma força material, que mais adiante até poderá compor o rol dos conteúdos probatórios.

Nesse sentido, alerta Bottini (2016, p. 2):

 

A prova é capaz de sustentar uma acusação ou uma condenação. O meio é apenas um instrumento para que as autoridades possam alcançar provas efetivas. As palavras do delator não demonstram fatos. Apenas indicam onde pode ser encontrado o material que comprove o ocorrido.

 

Verifica-se, portanto, que no que diz respeito à delação premiada, deve ser afastado o entendimento de que esta é meio de prova. Isso porque, a delação premiada difere, e muito, da prova testemunhal, sendo que esta ultima tem como função primordial no processo penal, é no sentido de refletir ou reconstruir um contexto histórico segundo a concepção da testemunha.

Advoga esse entendimento o professor Badaró (2012, p. 270):

 

Enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática (p. ex., o depoimento de uma testemunha ou o teor de uma escritura pública), os meios de obtenção de prova (p. ex.: uma busca e apreensão) são instrumentos para a colheita de elementos ou fontes de prova, estes sim, aptos a convencer o julgador (p. ex.: um extrato bancário [documento] encontrado em uma busca e apreensão domiciliar). Ou seja, enquanto o meio de prova se presta ao convencimento direto do julgador, os meios de obtenção de provas somente indiretamente, e dependendo do resultado de sua realização, poderão servir à reconstrução da história dos fatos.

 

Vê-se, portanto, que na delação premiada, o que se tem é um instrumento, ou seja, um meio para obter algo que satisfaça o interesse de uma das partes. Dessa forma, a delação, agindo como instrumento, serve como uma ponte para almejar um ou outros materiais e demais informações no sentido de dar consistência na ação.

Apesar de algumas discordâncias, assim como apontado alguns retrocessos no caso da não análise do instrumento de forma concisa em detrimento de seus limites, cabe aos operadores do direito buscar um modelo garantista e alternativo que também produza resultados esperados, resultados que sejam justos e que preserve as garantias fundamentais, o que demandará tempo, estudo e principalmente a prática, perante os erros e acertos. Mesmo porque, o instituto veio para ficar.

 

                                                   REFERÊNCIAS

 

BADARÓ, Gustavo. O valor probatório da delação premiada: sobre o § 16 do art. 4º da Lei nº 12.850/13. Disponível em: < http://badaroadvogados.com.br/o-valor-probatorio-da-delacao-premiada-sobre-o-16-do-art-4-da-lei-n-12850-13.html>. Acesso em: 18 out. 2016.

BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Colaboração premiada deve ser colocada em seu devido lugar. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2015-ago-04/direito-defesa-delacao-limites-nao-instrumento-arbitrio>. Acesso em: 17 out. 2016.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.

BRASIL. Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013. Lei das Organizações Criminosas. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm>. Acesso em: 18 out. 2016.

CONDE, Francisco Munhoz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal. 2. ed. Buenos Aires: Hamurabi, 2003.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

AQUINO, BELLO, DOMINGUES, Rubim Santos Leão de. Marco Antônio Bueno. Gilson Magalhães. Um sonho de liberdade. São Paulo: Moderna, 1998.

JOSÉ, Oiliam. Tiradentes. ed. Itatiaia. São Paulo: ed da Universidade de São Paulo, 1985.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

SOUSA, Marllon. Crime organizado e infiltração policial: parâmetros para a validação da prova colhida no combate às organizações criminosas. São Paulo: Atlas, 2015.

RAÓ, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 5. ed. anotada e atual. Por Ovídio Rocha Barros Sandoval. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

PINTO, Felipe Martins. Introdução crítica ao processo penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.

BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. Rio de Janeiro. Campus, Elsevier, 2012.

LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

SANTOS, Marcos Paulo Dutra. Colaboração (delação) premiada. Salvador: JusPODIVM, 2016.

MALATESTA, Nicola Framarino dei. A lógica das provas em matéria criminal. Nicola Framarino dei Malatesta; trad. de Ricardo Rodrigues Gama. 1. ed. Campinas: Russell Editores, 2009.

Dicas

O que torna uma lesão corporal grave ou gravíssima?

Redação Direito Diário

Publicado

em

lesão corporal

É bem recorrente a menção em uma notícia jornalística à ocorrência de uma lesão corporal de natureza grave ou gravíssima. Tal situação pode gerar dúvidas nos interlocutores, uma vez que nem sempre é explicado o critério utilizado para a classificação das lesões corporais.

A bem da verdade, não há complicação nesta matéria, haja vista que os parágrafos 1º e 2º do artigo 129 do Código Penal, qual seja o que tipifica o crime de lesão corporal, enumera as qualificadoras do aludido delito.

Veja mais: Qual a diferença entre os 3 tipos de asfixia: esganadura, enforcamento e estrangulamento?

Veja mais: Lei Maria da Penha: o que se enquadra como violência doméstica e familiar?

Lesão Corporal Grave

No caso da lesão corporal de natureza grave, tem-se que sua pena base é de reclusão, de 1 a 5 anos, enquanto a pena base da lesão corporal simples é de detenção, de 3 meses a 1 ano.

Ainda neste diapasão, são 4 as possibilidades que ensejam a incidência desta modalidade qualificada: (I) incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias; (II) perigo de vida; (III) debilidade permanente de membro, sentido ou função; ou (IV) aceleração de parto.

Lesão Corporal Gravíssima

Com efeito, em havendo lesão corporal de natureza gravíssima, a pena base evidentemente aumenta ainda mais, passando a ser de reclusão, de 2 a 8 anos. No tocante ao número de cenários que culminam com sua aplicação, são 5 os casos: (I) incapacidade permanente para o trabalho; (II) enfermidade incurável; (III) perda ou inutilização do membro, sentido ou função; (IV) deformidade permanente; ou (V) aborto.

Diante do que foi exposto até então, são imprescindíveis algumas considerações. A primeira delas diz respeito à debilidade permanente de membro, sentido ou função. A observação a ser feita é referente a casos onde a debilidade ocorre em órgão que possui um par, como é o caso dos rins e dos olhos. Dito isto, ocorre lesão corporal gravíssima ainda que o agente somente cause a deterioração do órgão remanescente, como quando a vítima apenas tem um rim ou um olho.

Ora, é evidente que a perda de um olho não acarreta na perda da visão como um todo. É igualmente incontestável que, caso a vítima dependa apenas de um olho para enxergar e venha a perdê-lo, ocorre uma lesão corporal gravíssima, pois não houve apenas debilidade, mas sim a perda total da função. Na situação em tela, pouco importa se o agente concorreu para a perda da visão dos dois olhos, pois a perda do sentido ocorreu com a eliminação do olho remanescente.

O segundo e último adendo versa acerca da incapacidade permanente para o trabalho. Há divergência doutrinária neste tópico, pois parte da doutrina se posiciona no sentido de que apenas há o enquadramento da lesão corporal gravíssima se houver inaptidão para qualquer modalidade laborativa.

Em contraponto, uma segunda corrente doutrinária se mostra mais flexível. Esta aduz que a incapacidade permanente é uma diminuição efetiva da capacidade física comparada à que possuía a vítima antes da lesão. Alem disso, deve ser observado o campo do factualmente possível, e não o do teoricamente imaginável. Logo, para a aplicação da sanção penal, não seria possível exigir de um artista ou intelectual que passasse a trabalhar como pedreiro.

Manual de Direito Penal - Volume Único

R$ 400,00
R$ 348,00
 em estoque
9 novos a partir de R$ 329,98
1 usados a partir de R$ 274,19
frete grátis
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:51

Especificações

  • Livro

Homicídio e lesão corporal: uma análise da quantificação das penas

R$ 35,18  em estoque
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:51

Especificações

Is Adult Product
Release Date 2016-05-26T22:48:37.262Z
Edition 1
Language Português
Number Of Pages 71
Publication Date 2016-05-26T22:48:37.262Z
Format eBook Kindle

A lei Maria da Penha na Justiça (2024)

R$ 109,90  em estoque
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:51

Especificações

Edition
Language Português
Number Of Pages 432
Publication Date 2024-02-26T00:00:01Z

Referências:
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 14ª Edição, 2014.

Continuar lendo

Artigos

O Vilipêndio ao Cadáver na Era Digital

Redação Direito Diário

Publicado

em

vilipêndio ao cadáver

Vilipêndio a cadáver é um crime que reflete a relação da sociedade com a dignidade humana, mesmo após a morte. Desde tempos antigos, civilizações atribuem um valor sagrado aos rituais fúnebres e ao corpo dos falecidos, entendendo que o respeito a esses aspectos é essencial para honrar não só a memória dos mortos, mas também a paz e a moral dos vivos.

Assim, leis surgiram para proteger essa dignidade, garantindo que o corpo e o descanso do falecido sejam preservados de qualquer ataque ou tratamento desrespeitoso. Vamos entender um pouco mais sobre isso.

Veja mais: Direito Digital e LGPD: livros para ficar por dentro em 2024

Abordagem histórica do vilipêndio ao cadáver

O sentimento que o homem tem em relação aos seus pares atravessou os séculos, gerações e a seleção natural. É uma característica intrínseca ao homo sapiens a capacidade de se afeiçoar aos outros de sua mesma espécie, permitindo que laços sejam criados como forma de facilitar a convivência em sociedade.

É por meio dele que se constroem os pilares das relações humanas, que vão guiar os homens por toda a vida e permitir que eles se unam com base tanto pela relação sanguínea quanto pela afetiva.

Esse sentimento não desparece após a morte de um ente querido, pelo contrário. Não são raras às vezes em que a dor da perda é responsável por unir e aproximar. O ritual fúnebre é a forma pelo qual as pessoas se despedem e isso é característica de todos os povos, independente de raça ou religião.

É nesse momento em que se cultua sua memória, integridade, história e imagem, de forma que esses valores transcendam sua morte. Além de ser uma forma de preservar a imagem do morto, também é o meio encontrado para acalentar os familiares pela dor da perda, que é sempre inevitável.

O culto aos mortos é comum a quase todas as épocas e quase todos os povos, vindo da Grécia antiga o costume de guardar luto, acender velas, levar coroas e flores. Segundo relato de Freud, o luto é uma forma de sobrevivência. É a forma usada pelos os que sobrevivem para lidar com a perda de alguém que continuará a ser querido, mesmo que não se encontre mais presente junto aos demais.

Se cadáver é o corpo humano que viveu, então o respeito que se deve aos mortos é consequência da vida que eles tiveram, da sua memória e do que fizeram em vida.

Vilipêndio ao cadáver e o Direito

No sentido tanto de proteger tanto a memória do morto quanto preservar os seus familiares nesse momento delicado, o Código Penal traz, em seu Título V, os crimes contra o sentimento religioso e o respeito aos mortos.

O legislador uniu essas duas espécies de crimes em um só Título por conta da afinidade entre eles, já que o sentimento religioso e o respeito aos mortos consistem valores éticos e morais que se assemelham, posto que o tributo que se dá a eles advém de um caráter religioso que se propagou ao longo dos séculos, abordando, assim, o vilipêndio ao cadáver.

O artigo 212 do referido diploma legal apresenta a tipificação relacionada ao vilipêndio ao cadáver ou suas cinzas, cominando pena de detenção de um a três anos, além de multa. O bem jurídico tutelado nesse caso é o sentimento de respeito aos mortos, já que o de cujus não é considerado titular de direito.

Assim, tutelar esse direito possui um caráter social e por isso que o sujeito passivo dos crimes contra o respeito aos mortos também é o Estado, já que ele é a personificação da coletividade e tem a missão de protegê-la como um dos seus interesses primordiais. O vilipêndio ao cadáver, segundo Rogério Sanches da Cunha, em Manual de Direito Penal – Parte Especial. Ed Jus Povivm, 7ª Ed. P. 433, se define como:

É crime de execução livre, podendo ser praticado pelo escarro, pela conspurcação, desnudamento, colocação do cadáver em posições grosseiras ou irreverentes, pela aposição de máscaras ou de símbolos burlescos e até mesmo por meio de palavras; pratica o vilipêndio quem desveste o cadáver, corta-lhe um membro com propósito ultrajante, derrama líquidos imundos sobre ele ou suas cinzas (RT 493/362).

Assim, a tipificação legal do vilipêndio é clara em nosso ordenamento jurídico e não deixa margem para dúvidas quanto a sua interpretação. Todavia, com o advento da internet e da rápida disseminação de imagens e informações, o vilipêndio ao cadáver ganhou novas formas de ser praticada.

Vilipêndio ao cadáver no mundo digital

O compartilhamento de fotos e vídeos que claramente desrespeitam a imagem do morto se propaga de firma assombrosa pela rede mundial de computadores em questão de minutos. Em casos de acidentes ou crimes brutais, muitas vezes as imagens chegam às redes sociais antes mesmo que as autoridades policiais e locais sejam comunicadas do ocorrido.

Este fato acaba gerando empecilhos às investigações, já que na tentativa macabra de registrar o ocorrido, as pessoas acabam contaminando a cena do crime e, consequentemente, prejudicando as investigações, tudo em prol de um motivo injustificável.

Não se pode alegar, entretanto, que essa forma de cometer o vilipêndio ao cadáver é uma das mazelas do século XXI. Antigamente a prática já existia, mas como as informações não se propagavam tão rapidamente, as imagens eram armazenadas em disquetes ou CD’s e levavam anos para serem expostas.

Hoje, ao contrário, a facilidade com que os arquivos digitais podem ser compartilhados, copiados e propagados atropela as ponderações sobre o certo e errado, bem e mal, engraçado e depreciativo.

Não é raro o internauta se deparar com imagens de corpos completamente desfigurados, que circulam pelas redes sociais de forma incessante, em um claro desrespeito à memória do morto e ao sentimento de pesar da família.

Assim, a família, além de ter que lidar com a dor da perda, ainda precisa suportar a situação vexatória de ver imagens do ente querido expostas aos olhos do mundo. Um momento provado torna-se público da pior maneia possível, gerando traumas e danos de difícil reparação.

O vilipêndio ao cadáver que acontece por meio do compartilhamento das fotos ou vídeos, entretanto, apesar de ser fato atípico para o Direito Penal, se insere na seara do Direito Civil e gera ilícito, já que quem provoca dano a outrem é obrigado a repará-lo, conforme se depreende dos artigos 186 e 927 do Código Civil (BRASIL, 2002), os quais seguem transcritos:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

O dano em questão trata-se, no caso do vilipêndio, da situação vexatória que a família do morto sofre ao se deparar com fotos ou vídeos do ente querido sendo compartilhados indiscriminadamente como se fossem motivo de diversão aos olhos de um público que se satisfaz com o sofrimento alheio. Este é o motivo pelo qual a conduta de divulgar merece tanto repúdio quanto a de quem fornece as imagens.

Dessa forma, busca o Estado, na sua qualidade de protetor da sociedade, preservar a memória do morto e evitar a situação vexatória pela qual a família passa. Quando isso não se configura possível, deve o Estado reparar o sofrimento causado à família da vítima como forma de modelo corretivo para evitar que tais condutas continuem a ser praticadas.

A atitude de quem divulga e compartilha tais imagens é reprovada jurídica e socialmente, com punições para ambos os casos. Não é por a internet ser um território aparentemente livre e onde todos podem expor suas opiniões que os direitos perdem as suas garantias fundamentais, motivo pelo qual se torna necessário ponderar antes de compartilhar e facilitar a propagação de qualquer conteúdo, e em especial os que são visivelmente prejudiciais e vexatórios. As responsabilizações cíveis e criminais, dependendo da conduta, existem e são aplicadas, mas a maioria das pessoas infelizmente só dá conta disso quando já é tarde demais.

Responsabilidade Digital na Era da Informação: Como Pais, Educadores e Jovens podem ser Cidadãos Digitais Conscientes, Verdadeiros e Felizes

R$ 9,90  em estoque
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Responsabilidade Civil do Estado e Tecnologia - 1ª Ed - 2024: Uma Releitura da Teoria do Risco Administrativo

R$ 144,00
R$ 136,76
 em estoque
7 novos a partir de R$ 86,40
frete grátis
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Responsabilidade Civil No Direito Digital

R$ 64,97  em estoque
2 novos a partir de R$ 64,97
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Responsabilidade Civil - Teoria Geral - 1ª Ed - 2024

R$ 494,00
R$ 284,82
 em estoque
5 novos a partir de R$ 284,82
frete grátis
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Manual de Direito Penal - Volume Único

R$ 400,00
R$ 348,00
 em estoque
9 novos a partir de R$ 329,98
1 usados a partir de R$ 274,19
frete grátis
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Especificações

  • Livro

Manual de Direito Civil - Vol. Único

R$ 383,00
R$ 250,00
 em estoque
17 novos a partir de R$ 250,00
frete grátis
Amazon.com.br
atualizado em 23 de janeiro de 2025 10:52

Especificações

  • Livro

Referências:

BRASIL. Código Penal Brasileiro (1940). Código Penal Brasileiro. Brasília, DF, Senado, 1940.
BRASIL. Código Civil Brasileiro (2002). Código Civil Brasileiro. Brasília, DF, Senado, 2002.
SOUZA, Gláucia Martinhago Borges Ferreira de.  A era digital e o vilipêndio ao cadáver. Disponível em: <http://gaumb.jusbrasil.com.br/artigos/184622172/a-era-digital-e-o-vilipendio-a-cadaver>. Acesso em 05 de janeiro de 2016.
CUNHA, Rogério Sanches da. Manual de Direito Penal – Parte Especial. Ed Jus Povivm, 7ª Ed. P.433
Image by Dorothée QUENNESSON from Pixabay

Continuar lendo

Dicas

Lei maria da penha: o que se enquadra como violência doméstica e familiar?

Redação Direito Diário

Publicado

em

maria da penha

A Lei Maria da Penha foi consequência de anos de luta pela defesa das mulheres no âmbito doméstico. O nome da lei é uma homenagem feita a uma das vítimas, que passou a lutar pelo combate à violência contra as mulheres após ter sofrido duas tentativas de assassinato pelo marido, tendo ficado paraplégica em decorrência dos ataques.

Em 2006, foi sancionada a Lei 11.340, a qual disciplina meios de prevenir, punir e erradicar as formas de violência contra representantes do sexo feminino. Acontece que o dispositivo presente nessa lei possui delimitações que, muitas vezes, são ignoradas nas informações transmitidas popularmente.

Nesse sentido, atenta-se que o texto legal é claro ao definir que se trata de “violência doméstica e familiar”. Assim, diferentemente do que muitos podem pensar, não basta que tenha havido uma violência contra uma mulher para que o crime esteja caracterizado. Então, o que seria essa violência doméstica?

Os legisladores tiveram essa cautela, a fim de evitar maiores contradições acerca do tema. No artigo 5º da Lei Maria da Penha (11.340/2006), restam determinadas as hipóteses em que se configura a violência doméstica e a familiar.

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único.  As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

Portanto, constata-se que é necessário que haja ou uma relação íntima de afeto, ou uma relação de parentesco, ou uma coabitação, não precisando haver as três hipóteses concomitantemente. Ou seja, pelo menos um desse elementos tem que estar presente na situação para que a violência se enquadre na punição prevista na Lei Maria da Penha.

Assim, faz-se uma ressalva quanto ao caso de o agressor já ter convivido com a vítima em uma relação de afeto íntimo, é o caso, por exemplo, de ex-namorados. Nesses casos, tanto a doutrina quanto a jurisprudência majoritária entende que é preciso que haja um nexo causal entre a violência e relação existente anteriormente entre eles. Desse modo, o motivo que levou a agressão deve advir da convivência que um dia existiu.

Nessa perspectiva, o julgado do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), CC 103813 de 24/06/2009, ratifica esse entendimento quanto a necessidade de ser observado o nexo causal entre a agressão e o convívio anterior.

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI MARIA DA PENHA. EX-NAMORADOS. VIOLÊNCIA COMETIDA EM RAZÃO DO INCONFORMISMO DO AGRESSOR COM O FIM DO RELACIONAMENTO. CONFIGURAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. APLICAÇÃO DA LEI 11.340/2006. COMPETÊNCIA DO SUSCITADO. 1. Configura violência contra a mulher, ensejando a aplicação da Lei nº 11.340/2006, a agressão cometida por ex-namorado que não se conformou com o fim de relação de namoro, restando demonstrado nos autos o nexo causal entre a conduta agressiva do agente e a relação de intimidade que existia com a vítima. 2. In casu, a hipótese se amolda perfeitamente ao previsto no art. 5º, inciso III, da Lei nº 11.343/2006, já que caracterizada a relação íntima de afeto, em que o agressor conviveu com a ofendida por vinte e quatro anos, ainda que apenas como namorados, pois aludido dispositivo legal não exige a coabitação para a configuração da violência doméstica contra a mulher. 3. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de Conselheiro Lafaiete -MG, o suscitado.

Portanto, constata-se a necessidade da observância desses termos que caracterizam a violência doméstica e familiar, as quais são elementos essenciais desse tipo, de modo que sua presença é indispensável para caracterização do crime previsto na Lei 11.340 de 2006.

Continuar lendo

Trending

Direito Diário © 2015-2024. Todos os direitos reservados.